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1536- Revisitando a Bioética da Beira do leito (Parte 5)

A não maleficência é um produto da Grécia antiga de tanta inteligência natural. Hipócrates foi quem formulou a concepção que não cabia ao médico fazer mal ao paciente. Apesar de seus 26 séculos de existência, o seu prazo de validade não se expirou. Na verdade houve uma mudança de gênero de modo que o seu nome social pode ser segurança, segurança do paciente. Que mudança foi essa? A concepção hipocrática de não provocar danos ao paciente nasceu numa época em que havia pouca chance de benefícios de modo que era prudente não inventar métodos apenas uma boa ideia ou por ouvir falar.

Com o tempo cresceu a noção que não bastava comprovar o benefício, mas também precisava conhecer eventuais adversidades do método. Esta evolução tem dois marcos históricos. O primeiro foi a descoberta da vacina por Edward Jenner (1749-1823) no século XVIII, quando a atenção sobre transferência de pústula de vacinia do gado de uma ordenhadeira para a pele de um garoto saudável de 8 anos de idade, nada voluntário de pesquisa,  era se ele iria contrair a varíola ou não. O segundo deu-se no limite da temeridade, quando William Whitering(1741-1799) no século XVIII também, após descobrir o efeito benéfico da digitalina, criou o método Whitering de digitalização, ou seja, a administração de doses até haver a toxicidade, manifesta por vômitos, xantopsia e bradicardia. Voltando, então, à mudança para segurança do paciente, que hoje possui um símbolo, o carimbo do omeprazol para a maioria das prescrições de medicamentos, exigindo uma auto-assessoria de natureza bioética.

Não se trata de uma síndrome do trem fantasma, que haverá um susto em cada curva, mas uma atitude cautelar, pois o médico dispõe cada vez mais de recursos beneficentes validados para aplicação e pode-se afirmar que inexiste chance zero de adversidades, ou seja, é fundamental que o método conceitualmente benéfico para o caso passe pelo pedágio da individualidade do paciente, por exemplo, a atenção à segurança do paciente que desaconselha a penicilina que seria ao antibiótico de escolha em alguém que com histórico de edema de glote em administração prévia. Recordando a metáfora do sal, o paciente-água em questão tem a disposição recíproca com o método-sal, só que o malefício poderá se antecipar ao benefício e o impedir, o que deve provocar a antevisão que transforma indicação em contra-indicação. 

Há enorme versatilidade na gestão de uma verdade no entorno de uma disposição recíproca.  De um lado, evidências tecnocientíficas são o encontro de uma verdade, não da verdade. Pegando carona em Sócrates (470 aC- 399 aC), a verdade para o paciente é que venha a ser útil na óptica dele. Na linguagem coloquial se diz que não era verdade, não funcionou. Nesta dissociação entre empenho do médico e receptividade do paciente no contexto da na conexão médico-paciente, no outro lado, do paciente, há o direito à voz ativa do paciente como intercessor da disposição recíproca entre o método e suas possibilidades validadas e o paciente e sua visão.  

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