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849- ASsim e SEnão (Parte 2)

Há um momento crítico nos muitos cenários de mistério que compõem tradicionalmente a beira do leito que se materializa como uma encruzilhada. De um lado chega o encalço do melhor conhecimento, habilidade e atitude pelo profissional da saúde e do outro lado chegam as reações do paciente sobre como é para se comportar e como deve considerar boas e más expectativas. Seu nome é consentimento livre e esclarecido.

Trata-se da expressão do direito à autonomia, tão simples como a verbalização de um Sim ou um Não, tão complexo pelas várias dobras entre as objetividades dos métodos recomendados e as subjetividades de um tipo de sentimento chamado desejo e que reafirma que o paciente é parte ativa na beira do leito contemporânea.

O consentimento livre e esclarecido funciona como um um código entre médico e paciente. Sem a senha Sim o sintoma/sinal não se transforma em investigação diagnóstica e esta não se metamorfoseia em terapêutica. Em outras palavras, o momento do consentimento pelo paciente é um ponto maior, um intervalo mesmo entre o processo de planejamento da estratégia terapêutica (não realizada ainda pela ausência do desejo expresso do paciente) e a sua efetiva realização- ou não.

A Bioética da Beira do leito enfatiza que a terapèutica que não existe – e é necessitada- poderá vir a existir na dependência obrigatória – salvo iminente risco de morte evitável- de uma palavra que não tem mais do que três letras na maioria dos idiomas. É aspecto linguístico curioso. Horas de suor e saliva sintetizadas num segundo. Uma pequena vocalização que comunica muitos afetos e provoca grandes impactos profissionais na medicina contemporânea. Não deixa de representar um alívio ético.

Sob o aspecto prático, o momento do consentimento inclui o valor de ajustes redutores de tensões e certa predisposição para a adesão do paciente no decorrer das realizações. Por isso, a adjetivação em livre – para desejar ou não- e esclarecido – sobre necessidades de momento e subsequentes.

Pela importância dos ajustes, é essencial que o profissional da saúde e o médico em especial esteja bem consciente que não detém a posse, aplica tecnociência e que seja bem treinado em comunicação perante excessos de vulnerabilidade e adversidades atuais e vindouras.

Certamente, é impossível nos lembrarmos de nossas posturas pré-profissionais, há uma lavagem cerebral após a entrada na faculdade que nos insere no profissionalismo deixando o leigo para trás. Ajudaria muito se pudéssemos lembrar, mas a dificuldade só acentua o valor de praticar certas estratégias de persuasão isentas, evidentemente, de intenções coercitivas, mas entendendo que adiantar o pé um pouquinho (o médico) impede que feche a porta (o paciente) e permite o diálogo motivador. O paternalismo brando assim entende sem nenhuma desrespeito à autonomia.

A verbalização empática e o uso de recursos de apoio fazem diferença na recepção pelo paciente e, ipsu fato, na sua resposta. Ponto fundamental, é que a rotina para o médico costuma ser novidade para o paciente e gera natural dificuldade de absorver aspectos óbvios para quem é profissional da saúde. O foco dirigido para um leigo reduz a chance da transformação da beira do leito numa torre de Babel, causa não incomum de representações éticas e legais contra o médico e perfeitamente evitáveis pelo treinamento e pela disposição de entender que pacientes constituem comunidades de interpretação necessitadas do desejo do médico de alinhar com o desejo do paciente na medida do possível.

Há uma linha traçada entre paciente-familiar-profissional da saúde que não é lado do triângulo paciente-familiar- profissional da saúde. Refiro-me à bissetriz – Triano segmento de reta que divide o ângulo do triângulo em duas partes iguais e vai até o lado oposto.

A  Bioética da Beira do leito entende que a bissetriz simboliza uma simetria e assim o valor dos ajustes da recomendação do médico atendendo ao que for possível partindo de paciente e de familiar. A bissetriz representa fio condutor do ângulo de visão do médico para  tocar com a harmonia possível a conexão paciente-familiar representada no lado oposto. Lado oposto na figura geométrica, mas ao lado na figura humana da beira do leito.

A Bioética da Beira do leito recomenda 10 dicas para o profissional da saúde a respeito do efeito bissetriz visando ao consentimento do paciente:

  1. Conscientizar-se do valor moral do consentiemnto livre e esclarecido;
  2. Distinguir desejo do paciente de necessidade médica de diagnóstico, tratamento ou prevenção;
  3. Admitir legitimidade em visões distintas sobre benefícios cogitados e adversidades possíveis;
  4. Adequar local e tempo para as interlocuções;
  5. Valorizar a influência das emoções sobre a recepção de dados e fatos;
  6. Empenhar-se pela efetiva realização do esclarecimento e renovar estratégias conforme necessário;
  7. Reconhecer fatores individuais do paciente passíveis de âncora para fundear compreensão e adesão;
  8. Ouvir-se criticamente falar nos esclarecimentos (evitar termos muito técnicos);
  9. Vigiar-se como ouve (evitar distrair-se com antecipação de réplicas) no diálogo com paciente/familiar;
  10. Assegurar comprometimento com qualquer natureza de acolhimento evolutivo.

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