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752- Liberdade! Liberdade! Abra as asas sobre nós (Parte 1)

Nos meus primeiros anos de Hospital das Clínicas em São Paulo fui protagonista de muita negação à liberdade do paciente. Cumpria com a melhor das intenções o papel que me cabia num efeito manada de pedagogia, com a sensação da almejada excelência na reprodução dos comportamentos profissionais que observava, o significado do aprendizado para o recém-formado num conceituado ambiente de hospital de ensino.

Na ocasião – década de 70 do século passado-, não havia nenhuma menção no Código de Ética Médica vigente sobre voz ativa do paciente e aquele que sucedeu a partir de 1984 reforçava como Principio 7 que é da exclusiva competência do médico a escolha do tratamento, podendo em beneficio do paciente, sempre que julgar necessário, solicitar a colaboração de colegas. Somente a partir de 1988 é que as normas éticas incluíram É vedado ao médico efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo em iminente perigo de vida (Art. 46).

Hannah Arent (1906-1975) ensina-nos sobre certas questões da liberdade. Em nossos múltiplos comportamentos, haveria contradições entre proposições da nossa consciência e princípios morais que afirmam que somos livres e a vivência realística da sujeição a inúmeras influências nem sempre amplamente conhecidas. Chama a atenção que entre forças e fraquezas, o ser humano manifesta suas vontades, o que significa uma tendência para  impor e a mandar, fato estranho em relação à preservação da liberdade.

Alguns vaivéns reflexivos em torno do tema da liberdade cabem na conexão médico-paciente que acontece na beira do leito de todos nós que apresentam certas peculiaridades em relação ao que se enquadra no âmbito da política. Do lado do  médico na ligação, vigem, atualmente, 26 princípios fundamentais do exercício da medicina, 11 normas diceológicas, 117 normas deontológicas e quatro disposições gerais que permitem expansões e provocam limitações na liberdade profissional. Do lado do paciente na ligação, ocorre a vontade de manter a rotina embora impactada pelo surgimento da doença e que causa restrição à independência do ir e vir.

É comum observarmos o paciente manifestar humanamente a inclinação para uma resolução simples, ele gostaria de impor algo como uns dias de alguns comprimidos, por exemplo, quando contudo, a tecnociência validada na pessoa do médico ético não lhe dá liberdade para muitas escolhas, a devida atenção ao prognóstico representa a aplicação de um procedimento invasivo, por exemplo.

A única maneira de preservar a liberdade em seu sentido amplo é o paciente renunciar à ajuda do que há de mais eficiente na medicina, ele pode, então, não dar o consentimento para o médico proceder à aplicação. É um direito sem obrigação de maiores justificativas mas – sempre tem um mas- uma influência na liberdade fica pairando sobre o paciente na figura de decorrências fisiopatológicas da doença. Na  situação de refém das mesmas, a liberdade entre mim e mim mesmo pode, então, estar algo artificial pela implacabilidade de prognósticos.

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