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403- Técnica e moralidade

Dar-se conta que a beira do leito convive hoje com cinco gerações de médicos é um preito e um instrumento da Medicina, reflete longevidade pessoal e profissional e promove intercâmbios apropriadores e harmonizadores em meio a despertar de exemplos e a acalantos  de nostalgia.

Os médicos com números mais baixos de CRM, devido ao acúmulo das vivências de desafios morais na beira do leito podem exercer um poder moderador sobre o comportamento dos mais jovens.  Há os que se dispõem a tal exercício de coleguismo hipocrático, mais frequente de maneira mais ocasional e não sistematizada, menos comum de modo organizado, como na conciliação de interesses dentro de uma equipe.

Se é fato tradicional que a geração precedente educa a seguinte, na beira do leito da presença de multiplicidade do período da formação na Faculdade provoca duas vias de direção de aprendizados. A atualização precisa correr atrás do progresso incessante.

Deste modo persiste a tradição do conhecimento propagado via oral do tipo mestre para discípulo – melhor dito atualmente colega para colega- entre médicos no quesito atitude respeitosa na inter-relação com a Medicina e seu constante progresso e com o paciente e seus sequentes movimentos sócio-econômico-culturais. Pois, assim como o paciente ensina o médico a ser profissional, a geração mais nova auxilia as mais antigas na compreensão de características mais atualizadas da sociedade.

A utilização cotidiana da técnico-ciência na área da Medicina é a forma eficiente de ser médico atualizado e livrar-se de certos vícios de formação. De modo semelhante, participar de um Comitê de Bioética proporciona visão mais clara do mundo real da condição humana que permeia a conexão médico-paciente contemporânea.

Num Serviço organizado, universitário ou não, o aspecto técnico costuma valer-se de uma estrutura vertical, uma carreira com ascensão relativamente rápida onde um Residente vai ascendendo no numeral, vira preceptor e logo adquire status de assistente. O grande impulsionador chama-se vontade – desejo+ação. Todavia, esta força propulsora não acontece – ou acontece timidamente- em relação ao enfronhamento em temas morais relacionados à utilização de uma Medicina cada vez mais necessitada de reflexões sobre o significado de aplicação de um ser humano a outro ser humano.

Neste sentido, visando ao acolhimento, a realidade quantitativa atual dos Comitês de Bioética (baixo número) precisa ganhar impulsos motivadores. Os profissionais mais velhos estão ocupados com sua rotina de atendimento assistencial estabelecida e os mais novos com a construção do dia-a-dia almejado- o mesmo vale para os que se dedicam à pesquisa.

A análise das perspectivas morais envolvidas mostra-se superficial, embotada pela utilidade da técnica e embutida num auto-convencimento que se atua pelo bem, que não há nenhuma intenção de dano, que não se infringe o Código de Ética Médica -não necessariamente com familiaridade com a centena de artigos.

Técnica e moral estão intrinsecamente relacionados na beira do leito, uma conexão que, em última instância, influência o prognóstico- do caso, da imagem do médico/Medicina na sociedade e do rigor científico em meio a premências de aberturas e tolerâncias no processo de consentimento pelo paciente. Na agenda contemporânea da beira do leito não cabe mais boa técnica aplicada sem a correspondência da moralidade.

Como acrescer vontade aos médicos que priorizam a sua evolução técnico-científica para dedicar algum tempo à valorização de apreciações metafísicas sobre aplicação profissional respeitosa ao gosto da Bioética? É desafio que persiste vivo na interminável construção, desconstrução e reconstrução da ponte para o futuro idealizada por Van Rensselaer Potter, que cada vez mais se assemelha ao mito de Sísifo em função das mudanças aceleradas da Medicina e da sociedade.

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