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986- Modo potencial (Parte 2)

O pedágio do consentimento que separa intenção (prudente) e consecução (zelosa) anima o propósito médico-paciente comum de lidar com um artesanato de informações e contrainformações, a elaboração que reduz desinformação e esclarece possibilidades que estavam em aberto. Paradoxalmente, abrir a cancela significa fechar uma deliberação, no sentido de ultimar estratégia. Efeitos da linguagem sensíveis na militância em Bioética.

A movimentação da cancela mental rejeita um Sem Parar para pensar. Numa necessidade de não esticar o tempo quantitativo, o tempo qualitativo faz-se resolutivo e o momento se passa como um caloroso congelamento da vida, um oximoro que expressa com fidedignidade a momentaneidade decisória que faz prender a respiração para lhe dar prolongamento.

Muito embora toque em doença, o impacto dá-se, essencialmente, no bem-estar e na qualidade de vida. É algo tão importante para a sensação de meu paciente e meu médico, todavia, infelizmente carrega a tendência a uma burocrática e insensível assinatura de papéis frios. O fascínio do sonho acordado dado pela esperança transmitida olho (do médico) no olho (do paciente) anestesiado por uma hierarquização da suposição de possibilidades de comportamentos antiéticos.

A Bioética da Beira do leito enfatiza que a chegada “ao ponto”, sinceridade e realidade irmanadas sobre o que passa ser o mundo naquele instante, rotação e translação brecadas por um estado mental complexo e delicado, lida com assertivas, ou seja, com afirmações defendidas com base em validações, sem, contudo, poder descartar alguma chance de vir a acontecer ou de se precisar de algo que foi judiciosamente deixado de lado.

A beira do leito há muito orbita pelo Deve ser, forma jeitosa de transmitir conteúdos em contextos impossibilitados de eliminar sentidos de indeterminações. Mais progridem ciência e tecnologia, mais brotam desafios, dilemas e conflitos, desabrochando conveniências da militância em Bioética.

No processo de consentimento sustentado pelo esclarecimento, face ao propositivo, o paciente de uma maneira dita livre – embora com várias amarras cognitivas e emocionais- deve compreender interdependências entre diagnóstico, terapêutica e prevenção. É muita coisa para leigos, razão de exigências de tradução para o prognóstico e de decodificação para sentidos de adversidades.

A Bioética da Beira do leito entende que males porventura causados por métodos beneficentes, verdadeiros amargos de doces, mesclam-se com necessidades, confundem-se muitas vezes com deveres e só podem ser bem mensurados em retrospectivas. Por isso, a força ética da prudência, a perspectiva em antecipação.

Certezas e probabilidades se mesclam e promovem reconceituação de expectativas, tudo muito dinâmico e influenciado por irrupções de significados não necessariamente unissonantes, manifestações de comunicação verbais e não verbais, captações como afirmações ou vaguezas e níveis de crença. Profissionalismo, confiança e autenticidade, idealmente caminhando juntos com tais expressões humanas e edificando o consentimento pelo paciente.

De fato, quando o médico expõe uma conjugação de mais provável diagnóstico e mais recomendada conduta, o paciente é solicitado a manifestar-se por Sim ou por Não entendendo que se trata do atualizado para o caso em termos de tecnociência. Há uma sinceridade profissional que representa, de fato, o que transpareceu dos métodos diagnósticos e suas decorrências éticas. Há uma compatibilidade com o estado da arte, longe de um absurdo, próximo de uma verdade, mas ainda na função modo potencial. Numa linguagem da Bioética da Beira do leito, na atuação presente não deveria ser diferente, mas poderá vir a ser diferente num futuro.

Na prática, maneja-se um deve acontecer. Esta expectativa requer que haja, pelo menos, um mundo possível para acontecer no contexto, uma compatibilidade com metas. O efeito será o consentimento porque outras possibilidades de acontecimento foram acomodadas, ou seja, passaram a exercer menos incômodo. Documentar é preciso!

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