PUBLICAÇÕES DESDE 2014

904- MMXX (Parte 5)

 

2020

 

O RNA predador é uma fênix atuante nas células humanas. Nelas regenera-se, desnecessitado de um termo de consentimento livre e esclarecido.

O novo coronavírus não precisou de um visto de entrada no ecossistema e pelos atributos, literalmente, viralizou. Espalhou-se pelos transportes à imagem e semelhança do veneno (vírus) e ascendeu ao status de preocupação-mor de uma nação. Rapidamente manifestou-se sem freios no espelho retrovisor, aproximando-se na aceleração do ponteiro dos segundos. Tínhamos a velocidade do som, a velocidade da luz, agora deu-se a convivência com a velocidade de um novo vírus.

A atmosfera contaminada faz respirar perda de vida útil e sofrer falta de ar da liberdade. O pulo inicial inter espécie do vírus que qualifica a infecção como zoonose faz lembrar Antoine Lavoisier (1743-1794): Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Ironicamente, o Pai da Química moderna perdeu a cabeça na guilhotina da Revolução Francesa. Vírus, contudo, não tem cabeça, acho. Nós é que ficamos com a cabeça longe do corpo e em contraposição com o desejo das pernas.

Atraídos pelas perspectivas trágicas, traídos pelo Feliz Ano novo recente e subtraídos do otimismo ficamos mais perto da dupla cidadania- reino dos sãos, reino dos doentes- citada por Susan Sontag (1933-2004). Repercutimos William Shakespeare (1564-1616): males que crescem desesperadamente só podem ser aliviados com mecanismos desesperados.

A conotação do contágio como atração fatal trazem à mente as amarras de Ulisses no mastro da embarcação de passagem pela ilha da sereias. Máscaras tampam o nariz e a boca, mas não o que se ouve que é perturbador- doença grave, muita morte, economia em queda livre. Um alerta de inevitável arrepia: temos todos de subir em direção a um tal de pico e por isso, procuramos forças motrizes repetindo para nós mesmos que a fé remove montanhas.  Fortalece a resiliência. Dá uma calibrada nas angústias.

O Brasil atacado, o sistema de saúde mobilizado, o eletrônico valorizado. Todos de prontidão. Todos vinculados e isolados. Todos antevendo deteriorações. Todos assombrados numa areia movediça. Todos cheios de opiniões. O folclórico todo brasileiro é um técnico de futebol transmutado em técnico de pandemia. Uma confusão sem remédio. Um silêncio terapêutico gritante. A Covid-19  furou a fila do SUS, as dezenas de outras doenças que aguardem.

Um ruidoso alerta pelo potencial da Covid-19 como doença profissional da saúde: cuidar com cuidado! Ser (ela) ou não ser (ela), eis a questão (imposta). Profissionais da saúde desafiados e reagindo de acordo com o hino pátrio: Verás que um filho teu não foge à luta, Nem teme, quem te adora, a própria morte.

Pelo choque da realidade, a literatura científica fez as vezes de um enorme sítio arqueológico, mas não revelou nenhuma camada de antecedências orientadoras de estratégias resolutivas. Frustrante! Ao mesmo tempo,  estimulante!  Recursos terapêuticos habitualmente aplicados para consequências análogas de outras doenças estão na linha de frente e a perspicácia profissional logo tratará de perceber justificativas de uso de métodos existentes em prol de melhor prognóstico.

A relevância da situação médica e a premência por resoluções clínicas configuraram emergência sanitária e conferiram prioridade para a alocação de recursos na área da saúde. Renovou-se o valor higiênico da desinfecção das mãos descoberto pelo húngaro Ignaz Philipp Semmelweis (1818-1865) e enveredou pelo campo da compulsão coletiva. Água e sabão, álcool em gel, água sanitária (hipoclorito de sódio) como kit de sobrevivência.

Até então, grandes mobilizações mundiais do século XX trouxeram estímulos à pesquisa em ciências da saúde, redirecionamentos da ética, incorporações de métodos organizacionais no sistema de saúde, conceitos sobre eficiência na beira do leito. O que nos trará a pandemia?

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