PUBLICAÇÕES DESDE 2014

799- Bioética presente

Epicentro é palavra que ouvimos mais frequentemente em terremotos, o local de onde decorrem expansões numa distância variável com danos proporcionais à avaliação da intensidade pela escala de Richter (Charles Francis, 1900-1985).

O termo repercutiu recentemente no contexto da saúde, referido à China como ponto de partida de um altíssimo poder de espalhamento de um novo vírus e potencial de interferência na qualidade de vida e na sobrevida da humanidade. Atingiu-se, rapidamente, o chamado Public Health Emergency of Internacional Concern, segundo certos analistas por falta de providências precoces no epicentro.  

Já contaminados, a associação de vulnerabilidade, responsabilidade e solidariedade faz pensar na contribuição da Ética. Mais do que um roteiro para abordagens e tomadas de decisão como algoritmo derivado de experiências pandêmicas, a aplicação da Ética é ferramenta multiuso para ajustar características biológicas e circunstâncias sociais do que se enfrenta no momento.  O potencial de contribuição para a desaceleração da pandemia fica de certa forma, porém, impactado pela justificada preocupação com o excesso de demanda para o sistema de saúde e consequente necessidade urgente do redimensionamento.  

Pode-se inferir, pois, que valores éticos e princípios colecionados de outras pandemias constituem guias fracos para fundamentar atividades concretas perante gravidade e probabilidade de uma nova pandemia, o que autores interpretam como decorrente de carência de discussão aprofundada sobre valores éticos e princípios como reciprocidade, confiança e justiça distributiva, a respeito de providências, por exemplo, isolamento/quarentena.  

E porque se acredita que valores éticos e princípios encontrados em planejamentos de pandemias acontecidas proverá pouco guia prático para a atual pandemia, precisamos mergulhar fundo na nossa. A Bioética da Beira do leito apresenta três observações:

I

Há muito de Bioética nesta pandemia. Nenhuma menção no entanto. Talvez se enquadre na Bioética de todos nós, ou seja, cada profissional envolvido reage com fundamentos da Bioética que assimilou desde que entrou na faculdade, ou até mesmo antes no colégio ou em casa, mas que não nomeia como Bioética. Presumo que há ênfase no que precisa ser feito e não na compreensão das variáveis – que demandaria muito tempo-, deixar que os resultados almejados justifiquem as medidas.

II

Qual um neurótico, só há um problema no radar, o que faz perder o sentido de liberdade. Toda a energia está direcionada para a pandemia. Não pode ser diferente, mas dificulta encontrar pontos de equilíbrio. Não basta que se diga que a situação está irritante e liberar reações, importa é como se reage em função do princípios da beneficência e da não maleficência e da virtude da prudência.

III

Há muito se diz que o mais importante tema da Bioética é a alocação de recursos. Circunstâncias associadas à Bioética que estamos vivenciando embutem dilemas a respeito de valores públicos e privados. Vale mencionar porque medidas concretas não podem dispersar a responsabilidade com os recursos, que, como se afirma, são finitos e de perspectiva insuficiente.

Isolamento/quarentena é beneficência ou não maleficência?

 O direito à autonomia deve ficar mesmo sob quarentena?

Justifica-se o sistema de saúde levar as doenças habituais para em segundo plano? Por exemplo, no mês de março, o azul escuro dedicado à prevenção do colorretal ficou esquecido;

O iminente risco de morte da emergência na beira do leito está bem substituído pelo evidente risco de morte na pandemia?

A comunicação de más notícias quanto mais explícita melhor?

A necessidade ideal de 50% da população imunizada pelo contato com o vírus para erradicação precisa ser esticada no tempo pela priorização da capacidade de assistência respiratória intensiva?

Notícias que na Itália haveria uma linha de corte de 80 anos para internar pacientes pelo congestionamento no sistema de saúde e seu efeito Orloff;

Obrigatoriedade de respeito máximo aos princípios da medicina baseada em evidências para a introdução de medicamentos que se associaram a benefício clínico assistencial?

COMPARTILHE JÁ

Compartilhar no Facebook
Compartilhar no Twitter
Compartilhar no LinkedIn
Compartilhar no Telegram
Compartilhar no WhatsApp
Compartilhar no E-mail

COMENTÁRIOS

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POSTS SIMILARES