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770- Anseios de uma médica contemporânea (Parte 2)

BBL, ao se diplomar, tinha tido quase nenhum contato com normas prescritas pelo Conselho Federal de Medicina no Código de Ética Médica. Ela estava, portanto, insuficiente para, face aos compromisso com a moralidade dos comportamentos à beira do leito, se constituir num pleno agente moral do código.

Ao início da Residência Médica, BBL tinha a educação, exemplos isolados do internato e o juramento de Hipócrates como guias para o interior de si e o próprio entendimento das responsabilidades pela posse de um número de CRM como orientação para o exterior.

BBL tinha, entretanto, bem presente o que lera num artigo sobre bioética quando se preparava para as provas da Residência, que uma das dificuldades históricas do recém-formado era dar calor humano à aplicação da fria tecnociência, desafio que inspirou Van Rensselaer Potter (1911-2001) a pensar na bioética. Ela mentalizava um termômetro da atuação em cada caso e, desta forma, criou um interessante ponto de referência para calibrar sua progressão profissional a partir de vaivéns entre instâncias de freezer e de forno.

Prática sobre prática proporcionou-lhe muitas colagens em seu currículo assistencial e acadêmico e contribuiu para lhe revelar o emaranhado de direitos e deveres que atua no ecossistema da beira do leito expresso em infinitos dialetos da tecnociência e sotaques humanos.

O desenvolvimento do profissionalismo incluiu transformações para se sentir verdadeira agente moral do significado da ética médica vigente que lhe exigia sequente aproximação de pessoas, as nomeadas como pacientes. Desta maneira, o simbolismo da posse de um número de CRM e do juramento de Hipócrates evoluiu para uma visão de mundo real do bem/mal e bom/mau, associado à medicina, progressão que se deu às custas de forte foco investidor tanto na individualidade (de cada paciente e de si próprio) quanto na cultura (da medicina globalizada e da sociedade).

Uma vez fora do útero protetor – ao término da Residência Médica-, BBL vivenciou múltiplas sensações, a ansiedade acerca de alcançar as realizações para as quais se preparara, o receio de se distanciar das atualizações cada vez mais aceleradas e a preocupação com a perícia exigente em cada caso. Cada plantão dava-lhe oportunidade para a percepção das expansões e limitações de competência, entendia como frequência a uma sala de aula motivadora do feedback habitual para o aperfeiçoamento dos conhecimentos, habilidades e atitudes. Era recorrente lembrar-se do professor de anatomia patológica que repetia ao início de cada aula: Quem veio primeiro, o médico ou o paciente? E a sua resposta ao final do ano: o paciente sempre primeiro em qualquer circunstância… embora cada vez haja mais controvérsias…

BBL esforçou-se para ser um espelho dos exemplos que aprovou e um avesso dos que desaprovou, lidou consigo para não resvalar no vedado pelo código de ética, organizou-se para compatibilizar tempos quantitativo e qualitativo e foi progressivamente aprendendo a se livrar de espaços extramuros moralmente minados e comprometedores do desempenho profissional, ela conseguiu ter boa noção do significado de conflito de interesses. O casamento e a maternidade imediata cooperaram como pedagogia para que ela calibrasse as proporções pessoais/familiares e profissionais que deveria perseguir numa agenda sempre sujeita a imprevistos.

BBL logo percebeu que a incompletude profissional é duradoura. De fato, por mais que ela acumulasse conhecimentos e habilidades pelas horas trabalhadas e de estudo, ela identificava deficiências em todos os atendimentos. Pela conscientização constante da ideia, BBL muitas vezes, inclusive, achou que se cobrava a perfeição. Mas, abandonou explicações, o que importava era manter a parabólica captação de qualquer lacuna ou novidade.

Continua na Parte 3

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