BBL, ao se diplomar, tinha tido quase nenhum contato com normas prescritas pelo Conselho Federal de Medicina no Código de Ética Médica. Ela estava, portanto, insuficiente para, face aos compromisso com a moralidade dos comportamentos à beira do leito, se constituir num pleno agente moral do código.
Ao início da Residência Médica, BBL tinha a educação, exemplos isolados do internato e o juramento de Hipócrates como guias para o interior de si e o próprio entendimento das responsabilidades pela posse de um número de CRM como orientação para o exterior.
BBL tinha, entretanto, bem presente o que lera num artigo sobre bioética quando se preparava para as provas da Residência, que uma das dificuldades históricas do recém-formado era dar calor humano à aplicação da fria tecnociência, desafio que inspirou Van Rensselaer Potter (1911-2001) a pensar na bioética. Ela mentalizava um termômetro da atuação em cada caso e, desta forma, criou um interessante ponto de referência para calibrar sua progressão profissional a partir de vaivéns entre instâncias de freezer e de forno.
Prática sobre prática proporcionou-lhe muitas colagens em seu currículo assistencial e acadêmico e contribuiu para lhe revelar o emaranhado de direitos e deveres que atua no ecossistema da beira do leito expresso em infinitos dialetos da tecnociência e sotaques humanos.
O desenvolvimento do profissionalismo incluiu transformações para se sentir verdadeira agente moral do significado da ética médica vigente que lhe exigia sequente aproximação de pessoas, as nomeadas como pacientes. Desta maneira, o simbolismo da posse de um número de CRM e do juramento de Hipócrates evoluiu para uma visão de mundo real do bem/mal e bom/mau, associado à medicina, progressão que se deu às custas de forte foco investidor tanto na individualidade (de cada paciente e de si próprio) quanto na cultura (da medicina globalizada e da sociedade).
Uma vez fora do útero protetor – ao término da Residência Médica-, BBL vivenciou múltiplas sensações, a ansiedade acerca de alcançar as realizações para as quais se preparara, o receio de se distanciar das atualizações cada vez mais aceleradas e a preocupação com a perícia exigente em cada caso. Cada plantão dava-lhe oportunidade para a percepção das expansões e limitações de competência, entendia como frequência a uma sala de aula motivadora do feedback habitual para o aperfeiçoamento dos conhecimentos, habilidades e atitudes. Era recorrente lembrar-se do professor de anatomia patológica que repetia ao início de cada aula: Quem veio primeiro, o médico ou o paciente? E a sua resposta ao final do ano: o paciente sempre primeiro em qualquer circunstância… embora cada vez haja mais controvérsias…
BBL esforçou-se para ser um espelho dos exemplos que aprovou e um avesso dos que desaprovou, lidou consigo para não resvalar no vedado pelo código de ética, organizou-se para compatibilizar tempos quantitativo e qualitativo e foi progressivamente aprendendo a se livrar de espaços extramuros moralmente minados e comprometedores do desempenho profissional, ela conseguiu ter boa noção do significado de conflito de interesses. O casamento e a maternidade imediata cooperaram como pedagogia para que ela calibrasse as proporções pessoais/familiares e profissionais que deveria perseguir numa agenda sempre sujeita a imprevistos.
BBL logo percebeu que a incompletude profissional é duradoura. De fato, por mais que ela acumulasse conhecimentos e habilidades pelas horas trabalhadas e de estudo, ela identificava deficiências em todos os atendimentos. Pela conscientização constante da ideia, BBL muitas vezes, inclusive, achou que se cobrava a perfeição. Mas, abandonou explicações, o que importava era manter a parabólica captação de qualquer lacuna ou novidade.
Continua na Parte 3