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729-Régua de riscos (Parte 1)

Pela tradição da busca incessante da objetividade, a medicina interessou-se pelo uso de réguas com predefinições de risco de adversidades maiores na aplicação de procedimentos invasivos conceitualmente beneficentes. Tornou-se prática ética alinhada ao princípio da não maleficência.

Numa extremidade fica o risco mínimo que não traz preocupações maiores e noutra fica o risco proibitivo que provoca a imobilização dos movimentos beneficentes favorecedores do prognóstico.

No princípio da não maleficência, o termo não persiste por sua historicidade. No estágio atual da medicina, qualquer ideia de real eliminação de adversidades ao lado da realização de benefícios fica tão somente no aspecto intencional. Já comentamos em outros artigos usando a metáfora do bastão.

Risco

A posição do caso do paciente na régua é determinada por uma soma de fatores conhecida por escore de risco. O racional do total obtido é caracterizar um juízo de aplicação aceitável com gradações que culmina no inaceitável. Um escore pode ser zero relativo à ausência dos fatores de risco avaliados, mas nunca o risco do procedimento em si é um zero absoluto.

O esforço de matematização do prognóstico perante procedimentos arriscados com base no feedback acumulativo com resultados prévios de casos similares sujeita-se a influências não contabilizáveis, pessoais, profissionais ou circunstanciais.

Fatores não mensuráveis por números como prudência, zelo e perícia fazem diferença no resultado da aplicação do procedimento. A imprevisibilidade da biologia não convive bem com a matemática, por mais que a Estatística se desdobre. Falhas de precisão por sub ou supervalorizações são costumeiras fontes de críticas. Quem tem experiência sabe que números são pontos de referência e exigem  ser judiciosamente considerados num determinado contexto.

O pioneiro escore de Lee Goldman (nascido em 1949) a respeito de probalidade de eventos cardíacos após cirurgia não cardíaca foi publicado há cerca de 40 anos. Desde então, abriu-se uma linha de discussões sobre o real significado prático de frios números de corte sobre chances de evoluções. É essencial que o conhecimento da verdade dos dados e fatos passe pelo pensamento crítico acerca do significado clínico e do valor do procedimento.

O número viabilizado pelo escore de risco impacta na conduta como fonte de referência para o exercício do consentimento. Tanto para o auto consentimento do médico para fazer a indicação processado pela consciência profissional, quanto para o consentimento- ou não- do paciente após esclarecido sobre a recomendação do médico, inclusive, de eventuias exclusões pelo excesso de risco de adversidade.

No estudo desbravador de 1977, o alto risco foi associado a 20% de probabilidade de complicações e a chance de óbito maior do que 50%. Estas grandezas assustadoras carregam a possibilidade da avaliação radical de risco proibitivo para a aplicação do método.

O termo proibido traz uma gigantesca conotação ética em medicina. A desaprovação profissional a um procedimento pelo atribuo de risco proibitivo é às vezes reconhecida como (boa)precaução, às vezes como (má)intenção restritiva.

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