PUBLICAÇÕES DESDE 2014

725- Efeito adverso (Parte 2)

Heteromedicação e automedicação são expoentes da medicina contemporânea. A polifarmácia cresce, trazendo à mente Miguel de Oliveira Couto (1865-1934): “… Nesta receita entrou toda a botica, só faltando o boticário… Como ficou tonta a natureza para atender a tantas ordens ao mesmo tempo…”.  

Numa visão mais contemporânea, a disposição recíproca entre fármaco e sistemas/órgãos/receptores/genética é mais heterogênea do que se pretende na beneficência da prescrição. Há o sal ativo, há veículos, há meias-vida, há peculiaridades metabólicas, há interações e há as morbidades e as comorbidades.  Obscuridades justificam-se!

Relaciono 10 observações sobre o lado sombrio do uso de fármacos que exige não somente a avaliação da relação risco/benefício para efetivar a prescrição, como também da arte de esclarecer previamente sobre as potencialidades de adversidades ao paciente.

  1. Todo fármaco sem exceção deve ser considerado agente em potencial de adversidades. A cogitação aplica-se ao prazo breve da utilização, ao uso continuado e ao futuro de modo geral. Fármacos em si ou alguma substância agregada têm sido alvo de supostas etiopatogenias insidiosas de doenças graves.
  2. O potencial de adversidades específicas e inespecíficas exige esclarecimentos do médico ao paciente no decorrer do processo de tomada de decisão. O juízo sobre os riscos pode provocar movimentos para ajustes simples ou radicais na prescrição.
  3. Uma primeira justificativa para o esclarecimento ao paciente acerca do potencial de adversidade de fármacos é a possível influência no consentimento do paciente  – contraposição á beneficência.
  4. Uma segunda justificativa para o esclarecimento ao paciente é o preparo para eventuais providências evolutivas – o alerta pelo paciente, modificação na dose, medicação adicional, suspensão do uso (não maleficência/segurança biológica)
  5. Existe o efeito nocebo- placebo negativo, expectativa negativa e ansiedade. Gêmeo do placebo, nocebo é uma substância que provoca dano ao paciente devido a expectativas negativas do paciente. Pesquisas clínicas revelaram que percentual de voluntários manifestam adversidades cogitadas em potencial (como na droga real) no decorrer do uso de placebo.
  6. Há evidências na literatura que na assistência, em pacientes suscetíveis, o efeito nocebo ligado à exposição do médico amplia as chances da realização das potencialidades. Tal resposta suscita dúvidas sobre seleção e modo de dizer ao paciente. Recorde-se que o Art. 34 do Código de Ética Médica vigente dispõe que é vedado ao médico deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do
    tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.
  7. Os efeitos adversos inespecíficos- epigastragia, cefaléia, tontura, sonolência, fadiga, insônia, mal-estar vago- estão mais associados ao efeito nocebo.
  8. A Bioética da Beira do leito entende obrigatórios os esclarecimentos sobre os efeitos adversos específicos, que em geral são os mais preocupantes, tanto em razão do consentimento quanto das necessidades evolutivas.
  9. A Bioética da Beira do leito entende como opcional os detalhamentos sobre os efeitos adversos inespecíficos, pois eles são mais banais e em geral são conhecidos por todos. O racional está ligado à evitação do efeito nocebo.
  10. A Bioética da Beira do leito entende que a eventual substituição da comunicação pelo médico de uma relação de efeitos adversos inespecíficos pela colocação à disposição – ” Me avisa caso haja alguma novidade…” – é eticamente justificável.

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