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684- Autonomia, um tema inesgotável (Parte 3)

A legitimidade da autoridade clínica está de mãos dadas com a validade da vontade do paciente e ambas cooperam para a moralidade do ecossistema da beira do leito constantemente impactado por metamorfoses causadas por novas proporções entre tradição, inovação e novidade. Trata-se de mais um exemplo que o potencial do abuso interfere na maneira do uso. O Sim ao médico pelo paciente é majoritário na beira do leito, mas a possibilidade de haver um Não traz salvaguardas a eventual abuso de autoridade. Todavia, o direito ao Não que nasceu para impedir inaceitáveis malfeitos estendeu-se para possibilidades de visões de tão somente desconformidade com inequívocas intenções de benfeitos. A metáfora do sol aplica-se, o médico sabe da sua condição central e o que o paciente percebe é o seu deslocamento pela terra.
Há muitas razões para o paciente negar o consentimento ao médico para aplicar a medicina que orbita pela tecnociência. Já  as justificativas para o direito à autonomia do médico são escassas,  e nem sempre bem compreendidas. Há muitas zonas cinzentas, onde a maior clareza é que há o domínio de obscuridades.
O Princípio fundamental VII do Código de Ética Médica vigente dispõe que o médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência … Questão interessante: a autonomia do médico aplica-se, essencialmente, a situações de não fazer porque não passaram pelo filtro da sua consciência, ou também, para situações onde poderia clinicamente fazer sem restrição moral? A primeira situação associa-se a muitas justificativas éticas, morais e legais. Já a segunda é mais complexa, pois encampa desde os limites da obstinação terapêutica até a impossibilidade de desempenho por não  consentimento do paciente. O médico precisa justificar-se, o que não é exigido do paciente.

Assim, a posse do número do CRM confere ao médico o direito a uma autonomia teórica que, não necessariamente, compartilha uma autonomia prática. Numa competição, parece que o direito à autonomia do paciente está sempre entendida em plano superior. Aí ocorre um aparente paradoxo: o exercício de um paternalismo brando pelo médico seria uma maneira ética de convivência entre autonomia do médico e autonomia do paciente? Creio que a resposta é afirmativa. Pois, o real comprometimento (insistência com moderação ante hesitação do paciente) com o estado de saúde do paciente que acontece pela hierarquização da ciência tem a oportunidade de um ajuste fino com um mundo real respeitoso do paciente.

Assim como há o termo hipótese diagnóstica por razões do exercício profissional na beira do leito há pressupostos de não consentimentos por razões da condição humana. A liberdade do paciente de dizer Não ao médico tem um cenário bem aceito onde há uma recomendação que a medicina entende mandatória. A tramitação entre o sentido do dever profissional de fazer e as realidades de não fazer é um dos mais fortes desdobramentos do crescimento do caráter social da medicina atuantes na beira do leito. Provoca sensações de protagonismos e antagonismos, inclusões e exclusões que interessam à Bioética.

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