PUBLICAÇÕES DESDE 2014

564- Paternalismo, o fraco, mais um pouquinho (Parte 2)

Conexão BLlivroO paternalismo, o fraco, aquele que se alinha com o paternalismo libertário e o “nudge” (empurrãozinho) e que não provoca nem proibições nem coerções posiciona-se na referida régua ética sob razões e intenções de promover o “melhor interesse do paciente”. Esforços para o esclarecimento da recomendação original, para o re-esclarecimento subsequente, para a não perda de tempo nas emergências, habitam o interior paternalista atávico do médico que se propõe a disponibilizar a Medicina necessária para a circunstância do paciente, idealmente, sem conflitos de interesse e ganhos secundários. Por isso, paternalismo, o fraco, cabe na angústia do médico de valorizar ao máximo a prudência perante o não consentimento do paciente.

É missão da Bioética esclarecer que a beira do leito contemporânea reconhece espaço para uma decisão de emancipação por parte do paciente e, assim, o não consentimento livre e esclarecido pelo paciente não significa imprudência do médico, pois subentende uma expressão de dignidade da pessoa humana, ao mesmo tempo em que pressupõe uma responsabilidade do paciente pela decisão.

O endosso do paternalismo, o fraco, considera que a Beneficência conduz a essencialidade da Medicina, e, assim,  somente dentro da estrutura da Medicina, um profissional e um leigo podem compartilhar utilidade e eficácia dos métodos validados. A imersão nas motivações para o não consentimento não é incompatível com o privilégio do direito à Autonomia sobre o princípio da Beneficência atrelado ao não consentimento pelo paciente.

Sim ou o Não do paciente é momento derradeiro do direito ao consentimento pelo paciente num processo que é, habitualmente, influenciado por vários circunstantes, haja vista que o ser humano é gregário. Costumeiramente, o médico exerce a influência técnica, indispensável como ponto de referência para que os demais influxos ocorram sob o âmbito dos desejos, das preferências, dos valores e dos objetivos verdadeiramente intrínsecos ao paciente ou modulados por opiniões de outros à volta do paciente- familiar, amigo, outro paciente, segunda opinião, Dr. Google, etc…

Na prática, observa-se que o Não do paciente pode ser provisório por uma série de emoções. Justamente por conhecer a condição humana, a insistência do médico dentro do limites da ética, provocadora de mais diálogos e recriadora de perspectivas, é perfeitamente justificável como mandamento da prudência àquele profissional.

Ao mesmo tempo em que não se pode ter a certeza de conhecer a plenitude da individualidade que está por trás do não consentimento daquele paciente à recomendação médica, qualquer tendência à burocratização do Não em nome da prevenção de hipotéticos abusos por parte do médico, sem uma sólida argumentação sobre a contraposição, traz o potencial de restringir o dinamismo que deve caracterizar uma conexão médico-paciente prudente e zelosa.

Idealmente, a contensão da violência – que habita o paternalismo forte- deve ser sustentada por disposições de “dentro para fora” do médico e não por normatizações heteronômicas com punições previstas. Os longos seis anos da Faculdade de Medicina mais alguns anos produtivos da Residência Médica, um aprendizado sob supervisão, são mais do que cronologicamente suficientes para despertar a vocação humanitária do médico. A Bioética como conhecimento e disciplina tem responsabilidade de prover o tempo qualitativo neste quesito tão importante.

Um dos objetivos da Bioética da Beira do leito é reforçar que o paternalismo, o fraco, é tradição da justa autoridade do médico pelo domínio que tem por ofício do diagnóstico, terapêutica e prevenção na área da saúde. É um atributo  que não deve ser distorcido como desrespeito a bem-vindas salvaguardas ao autoritarismo no ecossistema da beira do leito.

Se o bioamigo fizer uma retrospectiva profissional crítica verá que todos os dias pratica o paternalismo, o fraco, pelo argumento enraizado que sua eticofilia sustenta que é essencial evitar jogar a situação para debaixo do tapete porque adiante tropeçar-se-á  no calombo formado. Por outro lado,  nenhum Código de Ética Médica é capaz de inibir desmandos de um profissional eticopata.

COMPARTILHE JÁ

Compartilhar no Facebook
Compartilhar no Twitter
Compartilhar no LinkedIn
Compartilhar no Telegram
Compartilhar no WhatsApp
Compartilhar no E-mail

COMENTÁRIOS

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POSTS SIMILARES