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543- Autoridade e Persuasão

Intenções, convicções e normas mesclam-se no processo de tomada de decisão na beira do leito. Uma “obediência” do paciente ao médico prevalece majoritariamente no ato do consentimento livre e esclarecido. É indício de confiança no recomendado em direção ao alívio do sofrimento.

A aceitação -com ou sem maior discussão- reflete um certo condicionamento que se inicia desde a mais tenra idade, onde os pediatras têm grande responsabilidade, além, evidentemente, do ambiente doméstico acerca do valor do médico.

Todavia, as recepções pelo paciente têm sempre o potencial de provocar insubmissões, inconformismos, não consentimentos pelo paciente capaz ao exercer um indelegável direito de manifestar voz ativa. Configurações cognitivas que incluem o médico é um senhor agente da Medicina e o médico não é o senhor da Medicina catalizam reações num influenciado pelo presente das manifestações clínicas e pelo futuro presumido tanto de curto prazo- como os percalços de uma cirurgia- como de médio e longo prazos – como pressuposições de limitações sobre a qualidade de vida.

Assim, um percentual da conexão médico-paciente variável em cada especialidade requer apoio à apreciação crítica do paciente por meio da inserção do paciente no processo de tomada de decisão munido de esclarecimentos de maneira sistematizada e imparcial pelo médico.

Torna-se desejável a disponibilidade de uma plataforma para a sustentação dos argumentos, que possa ter mais chance de manter-se a prumo sobre a areia movediça de contraposições envolvendo Medicina-médico-paciente-instituição de saúde e sistema de saúde. É difícil inexistir alguma necessidade de aparo de arestas mesmo em casos aparentemente simples.

A Bioética da Beira do leito é uma plataforma que se vale da combinação de matérias-primas da Ética (prudência e zelo), Bioética (princípios da beneficência, não maleficência e autonomia) e transdisciplinaridade (rigor, abertura e tolerância).

Ela facilita a compreensão dos lados envolvidos sem pretender que a menor distância entre dois pontos de vista é uma reta. Conceitos e preconceitos energizam chances de conflitos e cabe à plataforma promover o nível de segurança possível para a efetivação de conciliações. A clareza deve ser a pedra de toque.

Um aspecto que deve ficar bem claro no manejo da plataforma é que a autoridade do médico eticamente exercida em nome do estado da arte da Medicina subentende um acatamento. A legitimidade do poder está na disposição de promover o melhor interesse do paciente, longe de coerções. A salvaguarda entre poder de autoridade e sensação de autoritarismo na contemporaneidade da beira do leito faz-se por meio do direito ao exercício do consentimento pelo paciente.

Talvez não haja tanta clareza a respeito da legítima autoridade do médico para ajustar a Medicina às necessidades do paciente em consonância com as disponibilidades institucionais e do sistema de saúde pela promoção da persuasão, ou seja, a insistência – com boa-fé, evidentemente- de argumentação pelo médico para a obtenção de uma equalização de apreciação pelo paciente. Trata-se de um comportamento profissional reacional à manifestação de um não consentimento pelo paciente, onde o médico procura reforçar e ampliar esclarecimentos presumindo que o paciente ou está dominado pelo receio, ou não teve o alcance necessário, ou está sob influências equivocadas de terceiros. Denominamos a promoção da persuasão dentro dos limites da ética de paternalismo fraco. Embora carregue um termo que se tornou “eticamente incorreto” (paternalismo), a adjetivação de fraco minimiza conotações de autoritarismo.

A Bioética da Beira do leito entende que o paternalismo fraco é admissível em qualquer situação de real comprometimento do médico com os objetivos do paciente. Ele se identifica com a tradição da Medicina da validade do esgotamento de esforços em prol do paciente. A moralidade da atuação do médico na beira do leito não fica comprometida pelo paternalismo fraco, quando a intenção não é a de desrespeitar o Não é Não, mas, a de se certificar que foram afastadas possíveis influências desviantes da íntima vontade de um leigo vulnerável- o paciente.

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