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534- Quantum satis do leque comunicativo

Thomas Jefferson (1743-1826) ensinou que diferenças de opinião não significam necessariamente aplicação distinta  de mesmos fundamentos. De fato, o apoio de referências para a formulação de pontos de vista está sujeito a ajustes de interpretação perante realidades das circunstâncias. Esta consideração vale para a beira do leito.

A emissão de recomendações e esclarecimentos do médico ao paciente para a atenção a suas necessidades de saúde pode ser figurada num grau variável de abertura de um leque comunicativo em função de seleções pró-beneficência e  anti-maleficência.

No campo da terapêutica, disponibilidades crescentes de métodos requerem comportamentos de prudência em relação a novas relações risco/benefício e custo/efetividade. Assim, sucessivas adaptações de composição na comunicação do médico ao paciente ocorrem motivadas por fatores que a vivência profissional vai colecionando como eticamente válidos. Mesma plataforma ética dando sustentação a aberturas do leque personalizadas.

Neste contexto, a dosagem do que se decide apresentar do conhecimento pertinente da Medicina ao paciente é regulada por uma avaliação do quantum satis da abertura do leque para as particularidades do caso. É tarefa habitualmente complexa pautada  em análises de escalas de flexibilidade admissíveis sobre o rigor tecnocientífico – por exemplo comunicar tão somente recomendações IA porventura existentes sem menção às IIA no processo de consentimento pelo paciente – e em simplificações justificadas de exposição- por exemplo prescrever um antibiótico sem comentar sobre demais sensibilidades registradas no antibiograma.

Os balizamentos exigíveis pelo binômio autonomia-consentimento para a comunicação médico-paciente de opções terapêuticas incluem apreciações binárias entre o clássico e a inovação, disponibilidades e indisponibilidades de infra-estrutura, acervo global e habilidades preferenciais do médico, visão de placebo e de nocebo, posições da literatura e experiência pessoal, patrimônio da Medicina à disposição e solicitações de restrição pelo paciente e, muito importante, atualidades da Medicina e real atualização do médico.

Em outras palavras, pode haver um Sim de cumprimento da ética para única recomendação “paternalmente” selecionada pelo médico por razões variadas (abertura pequena do leque) ou um Sim de cumprimento da ética que funciona como um discriminador entre possibilidades cada uma delas com seus prós e contras (abertura maior do leque).

quantum satis da abertura do leque está, assim, intimamente ligado ao processo de esclarecimento requerido para o consentimento pelo paciente. É o cenário do médico que assume a responsabilidade pelo caso que inclui  tornar o paciente o mais ciente possível do seu raciocínio clínico em direção a uma tomada de decisão. Caracteriza a articulação de um lado do dever do médico de cuidar e do outro da confiança depositada pelo paciente, essencial para progressão eticamente válida da recomendação para a execução. 

Ressalve-se, entretanto, que qualquer grau de abertura do leque de comunicação do médico ao paciente está sempre exposto a juízos de natureza ética e legal. Embora haja necessidade da análise caso a caso, em princípio, não ocorre imprudência quando o grau de abertura do leque satisfaz o quantum satis de acordo com uma posição médica endossável por colegas respeitáveis, embora não satisfaça o quantum satis recomendado por outros também respeitáveis colegas.

 

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