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363- Permitir e consentir

Embora sinônimos no dicionário, consentir e permitir têm significados diferentes na beira do leito. O paciente permite como resposta a um dá licença educado dito pelo médico que deseja fazer o exame físico ou a quem lhe solicita esticar o braço para coleta de sangue. Na permissão, não se espera uma negativa. Já o consentimento difere justamente pela possibilidade de haver um não do paciente à pretensão do profissional de saúde.

Muitos colegas manifestam suas apreensões em relação ao ritual do consentimento, alegando que o médico deve elaborar sua recomendação previamente e não fazer as sucessões de seleção de métodos sobre validade ou não para o caso sempre com a participação direta do paciente. Eles entendem que devem vir esclarecer o paciente com uma decisão já aparada em relação a exclusões de possibilidades teóricas desaconselhadas pelas circunstâncias. Ou seja, uma decisão alinhavada no estado da arte, mas com potencial admissível para certos ajustes, quer na essência da recomendação, quer no timing da aplicação.

As pesquisas clínicas trazem conclusões de benefício que são autorizadas a serem levadas à beira do leito para cumprimento da excelência. O médico domina o labirinto de evidências da Medicina para uma infinidade de situações clínicas, fatos e dados não devem sobrepujar suas emoções.

Tradicionalmente, em expressivo percentual de casos, o médico recolhe informações diagnósticas do paciente e dá a devolutiva terapêutica quando a estratégia validada e atualizada está composta, apresentando-a ao paciente por meio de esclarecimentos – retrospectiva das fundamentações utilizadas-, e somente nesta ocasião conhece a opinião do paciente, a sua manifestação sobre desejos, preferências, valores e objetivos aplicados ao recomendado. Nem sempre, pois, há oportunidade -ou intenção- de ir compondo inclusões e exclusões de composição de conduta -dita longitudinal- na base de um pingue-pongue médico-paciente, mutuamente acertando aqui, tolerando ali, revendo acolá.

A Bioética da Beira do leito estimula o desenvolvimento de hábitos comunicativos pelo médico, incorporando a sensibilidade para perceber quando e quanto deve falar ou se calar no decorrer de um atendimento eletivo -paciente novo ou já conhecido-  ou de emergência e de acordo com peculiaridades da especialidade médica.

Certamente, há situações onde o diálogo médico-paciente pode- e deve-acontecer pari-passu ao raciocínio clínico, assim, lidando progressivamente com o consentimento, e há situações onde este consentimento é tão-somente um momento ao final da elaboração estratégica, quando, então, frequentemente, se superpõe a uma simples permissão dada em confiança, até porque muitas vezes os esclarecimentos nem são captados com a necessária intensidade- razões pessoais, razões do sofrimento do momento- para sustentar contraposições.

A literatura coleciona artigos que concluem – e alertam- pela baixa frequência de tomadas de decisão de fato compartilhadas com o paciente. É interessante analisar que, não necessariamente, este comportamento representa uma violação do direito do paciente ao consentimento ou não à recomendação do médico. É disposição que traz à discussão o valor de uma Bioética, que intercessora em inúmeras composições de relação médico-paciente, faz-se entusiasta de individualizações adaptativas e reticente a certos fundamentalismos.

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