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1348- Intenções, atuações, paradoxos e a Bioética da Beira do leito (Parte 5)

O aprendizado/treinamento em medicina equivale à aquisição de um idioma técnico-profissional. Corresponde a um abre-alas técnico exigente de integração com a linguagem pré-profissional por meio de correspondências cognitivas que envolvem ganhos de confiança das informações, motivações para desempenhos, ordenações para lidar com complexidades, aspectos emocionais, apoio para seleções de composições e coordenação para concluir tomadas de decisão. As características da arrumação interna na passagem da condição de leigo para profissional são capitais para a qualidade moral do ser/estar/ficar médico e, na contemporaneidade, tem como um de suas vitrines críticas como discorre o esclarecimento para o consentimento pelo paciente.

Neste contexto de aquisição de modos de pensar com lógica e com senso comum para lidar com realidades da atenção às necessidades da saúde humana, alinhado a peculiaridades de interpretação epistêmica e a incontáveis maneiras de fazer aplicação, a Bioética da Beira do leito chama a atenção para a contribuição pedagógica do significado de paradoxo. É acervo expressivo na busca/construção de um si mesmo profissional, até com pitadas de originalidade, mas seguramente moral. O paradoxo vai além de uma restrição a um ato-de-fala, a uma  asserção curiosa- Eu posso resistir a tudo, exceto à tentação, contradição dita por Oscar Wilde (1854-1900) em uma de suas obras-, ele reproduz tensões do cotidiano.

De fato, esta figura de pensamento relacionada a aparentes contrassensos tem o dom de movimentar caminhos de compreensão para contradições do cotidiano profissional com as quais nos acostumamos, tornamos “faz parte”, inevitáveis, até inadequadas, maleficentes inclusive,  que se associam a evoluções individuais pós-aplicação mesmo prudente e zelosa de recomendações clínicas/tecnocientíficas validadas como beneficentes. De certa forma, probabilidades paradoxais, ao alertarem para as dificuldades de precisão na medicina e induzirem raciocínios sobre chances de fatos, nutrem a chamada medicina defensiva, uma porta de saída mental que se associa frequentemente a exageros.

Maleficências podem ser adjetivadas como “absurdos” da governança da beira do leito pela visão leiga, um ponto negativo tradicional da medicina, corrosivo da conexão médico-paciente, iatrogenia exacerbada numa extensibilidade indefinida pelo progresso beneficente e que incentiva o desenvolvimento da medicina de precisão – que leva em conta variações genéticas individuais, ambiente e estilo de vida  pessoal  aproxima-se da utilidade e da eficácia pretendidas, derivando do habitual prêt-à-porter para o sentido do alfaiate-, objetivando, justamente, a intenção de futuro de por meio de mapeamentos minimizar o hipocrático, genérico, e porque não paradoxal alerta Senhor médico, non nocere!

Aliás, a medicina é congenitamente paradoxal na medida em que raciocínios lógicos pressupõem resultados incertos, contraposições de sentidos dentro de mesma ideia que caracterizam um paradoxo verídico e, ademais, resoluções provocam, habitualmente, desdobramentos exigindo novas resoluções, bem como continuidades, caracterizando um paradoxo condicional. Em termos práticos, é paradoxal a aparente contradição entre o médico ter de estar convicto e, simultaneamente, ter consciência sobre dúvidas. Em síntese, flexibilidade no acreditar/duvidar é essencial perante paradoxos.

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