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1248- Valências no ecossistema da beira do leito (Parte 10)

Ambivalências no ecossistema da beira do leito ao denunciarem tensões – habitualmente desconfortáveis- entre intenção (de beneficência e atitude (em prol da não maleficência) as situam nos dois componentes da conexão profissional da saúde-paciente. Recorde-se que bem ao início da pandemia de Covid-19, uma então disposição “heroica” ao uso da hidroxicloroquina acarretou hesitações em função de um alerta sobre o potencial de adversidades. Um típico Primum non nocere imortal há 26 séculos que significou que a valência injustificável pelo risco conhecido em outra indicação terapêutica fazia-se superior, na ocasião, à cogitação de valência justificável.

No lado do médico, as tensões ambivalentes são tradicionalmente englobadas em raciocínio clínico, o mecanismo cognitivo pelo qual seleções sobre a teoria e sobre a prática, enfrentamentos de desafios, desfazimentos de dúvidas e contornos de dilemas e conflitos, encaminham para um produto final de melhor interesse para o paciente, vale dizer numa adequada perspectiva de relação beneficência/(não)maleficência.

No lado do paciente, a ambivalência é de se esperar mais ou menos explicitada e com direito à existência no processo de tomada de decisão pelo princípio da autonomia. Mais especificamente, a ambivalência está no cerne de habituais Talvezes ou Nãos provisórios. São reações mais cuidadosas (Talvez) ou mais açodadas (Não provisório) que significam que no fundo consentir ou se recusar se fazem irresolutos. É situação que deve estimular atuação intra e interpessoal do profissional da saúde sobre as valências – o que se denomina de paternalismo, o brando.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A ascensão ética do direito à autonomia pelo paciente motivou a demonização da concepção de paternalismo na beira do leito por enxergá-lo um agente de coerção/proibição sobre seleção de valência na voz ativa do paciente. Logo se verificou que não cabia o radicalismo, e, assim, houve a separação pela adjetivação: paternalismo, o forte (inadmissível) e paternalismo, o brando (coerente com a habitual dedicação à recomendação do melhor pelo profissional da saúde).

A Bioética da Beira do leito enfatiza que o adjetivo brando representa esforço/reforço e atenção para a melhor compreensão bilateral das causas dos eventuais Talvezes ou Nãos provisórios, sem, todavia, impedir a decisão do paciente pelo Não definitivo.

Acentua-se a natureza complexa da seleção de valência para justapor subjetividades e objetividades no ecossistema da beira do leito quando reconhecemos que existe também o Sim provisório, pois o consentimento além de livre, esclarecido e renovável, é também revogável – a qualquer momento ainda possível. É provável, bioamigo, que você já tenha passado por isso: o paciente lhe deu consentimento ambulatorial para um procedimento invasivo e, ao se internar, fortalecem-se aspectos negativos que causam desistência e solicitação de alta hospitalar – e você até ficou na dúvida se deveria considerar alta a pedido. Outra situação é quando o paciente tem súbita reação de ambivalência no aconchego do seu lar e decide trocar o Sim pelo Não, para si mesmo, ao se impressionar com a leitura da relação de adversidades da bula do fármaco prescrito, comprado… e necessário. Curiosamente, a desistência mantém a valência positiva da beneficência, mas hierarquiza a valência negativa da maleficência. Antecipações sobre o conjunto de adversidades na bula incluem-se no exercício do paternalismo, o brando. A bula da levotiroxina que tomo diariamente relaciona parada cardíaca…

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