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1230- Trans e pós-humanismo na beira do leito. Uma leitura com o apoio da Bioética (Parte 31)

XIV

Livre pensar 

Livre pensar é só pensar (Millor Fernandes, 1923-2012)

 

Dentro de nós, como diz a psicanálise, caminhando ao lado, como diz o poeta, temos um alter ego que visitamos e dele nos esquecemos periodicamente e que carrega matéria-prima para vislumbrar e/ou praticar transgressões. Considerando o pós-humano, comportamentos transgressores da companhia do biológico com o artificial abrangeriam várias dimensões: local de integração diferente do anatômico, funções “não fisiológicas”, habilidades computacionais, fontes “não metabólicas” de energia e acréscimos de vulnerabilidades relacionadas à segurança.

A Bioética da Beira do leito acolhe o conceito de transgressão que significa ir mais longe, além de um admissível possível e que pressupõe fronteiras como temporárias porque de tempos em tempos ganham libertação em relação à maneira “cativa”, conforme nos legou Michel Foucault (1926-1984).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Na crítica de insatisfações e de inconformismos acerca de novas realidades associadas a uma tecnociência pluralista, portanto, motivadora de transgressões, filtros da Bioética facilitam avaliar tanto as pressuposições de risco para a humanidade quanto as justificativas para um “selo de segurança”.

Uma das decorrências positivas e admissíveis de uma ponte entre significâncias correlatas de transgressão e transformação é o enriquecimento social. A quebra das fortes resistências éticas à teleconsulta determinada pela pandemia de Covid-19 na velocidade de um passe de mágica é ilustrativa. Significa que a mente humana que pensa/intui o até então impensado/não percebido porque atenta à natureza, sensível a metamorfoses, ajustadora de valores predispõe-se a reconfigurar realidades. Por isso, amanhãs não são exatamente espelhos das vésperas.

A Bioética deixa bem claro desde suas origens que a ciência provê “o que” e a tecnologia disponibiliza “o como” e ambos requerem o “para que” e o “para quem”. Um “quem” que atualmente associa-se à pós-verdade (fatos objetivos têm menos influência na opinião pública do que os apelos às emoções e às crenças) e à modernidade líquida (as relações entre as pessoas são fluidas, se transformam de maneira muito rápida e imprevisível, conforme pensamento de Zigmunt Bauman, 1925-2017). Observam-se inúmeras situações da cautela interrogativa Quero? Posso? Devo? tornada afirmativa Se eu quero, eu posso e eu devo!

A Bioética da Beira do leito intenciona cooperar para a qualificação de maneiras de estar com o outro em situações de gangorra entre ordem e caos envolvendo a conjugação de métodos clássicos e inovações na saúde. Ela valoriza tanto a abertura quanto a tolerância no entorno de transgressões/transformações, especialmente procurando a mais adequada crítica ao binômio idealização – evidência.

Aspecto essencial sobre o futuro pós-humano ligado às questões da saúde, é que apesar de toda cautela que possa haver com uma continuidade de transformações que consiga evitar fortes sobressaltos causadores de  heterogeneidades, é impossível não projetar a convivência de blocos distintos de efeitos – bióticos e abióticos-, em regiões diferentes ou em mesmas regiões. Decorrências num país continental como o Brasil são bem imagináveis.

Haveria, no contexto do sistema de saúde, por exemplo, proporções de “gente” mais próximas das humanas de hoje e mais transmudadas pela tecnologia, bem como a possibilidade de pequenos grupos mais favorecidos e atribuindo-se maior importância.

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