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1078- Bioética e Medicina Baseada em Evidências (Parte 3)

A Bioética da Beira do leito valoriza o processo de tomada de decisão de forma sistemática na beira do leito. Significa a incorporação das pressuposições acerca da experiência clínica individual e da base na fisiopatologia para a prática clínica, sempre que possível, ao uso de conclusões de estudos sistemáticos, reprodutíveis. A vantagem está na elevação da confiança na utilidade e na eficácia da conduta, considerando que a compreensão da fisiopatologia é insuficiente e que há necessidade de regras bem definidas.

Assim sendo, o profissionalismo na beira do leito qualifica-se pela ênfase no  refinamento de probabilidades ajustado tanto aos fatos e dados do paciente quanto ao acervo confiável e atualizado da literatura.

Depreende-se, pois, que o princípio da beneficência no sentido da utilidade e eficácia- separar o joio do trigo- e o princípio da não maleficência no sentido da individuação – há acasos e não casos clínicos- convergem com o espírito da Medicina Baseada em Evidências, considerando sua proposição original.

A Bioética da Beira do leito reforça que o processo de escolhas de métodos necessita considerar fortemente os benefícios cogitáveis e os riscos previsíveis dos desfechos, especialmente perante situação clínica complexa, lacunas na composição do diagnóstico e intensa participação opinativa do paciente. Combinações que dão às diretrizes clínicas o simbolismo registrado há anos pela Bioética da Beira do leito: algema não, bússola sim – atualizado para tornozeleira eletrônica prescritiva não, waze sim.

Ao longo da minha graduação formal e pós-graduação incessante que atapetaram metamorfoses profissionais, que se parar para nelas pensar me deixará absorto por bom tempo, envolvi-me com várias espécies de tomadas de decisão clínica. Cada uma tornou-se matéria-prima para ferver no meu caldeirão pessoal, mexida constante num caldo de múltiplos ingredientes que adquiriu melhor consistência e gosto quando acrescentei Bioética efervescente.

Lidei com o dogmatismo de é a melhor maneira – e pronto-, com a confiança de que é a maneira como fazemos aqui – ou quer, ou quer-, com a base que é a maneira que tem funcionado – porque mudar?-, com o niilismo do não importa o que for feito – a medicina ainda é bem carente de recursos beneficentes. A partir da disponibilização de diretrizes clínicas pelas sociedades de especialidade, a composição do caldeirão adquiriu maior proporção do coletivo sem, evidentemente, desprezo pela minha individualidade profissional.

Por falar nisso, bioamigo, como anda a fervura do seu caldeirão profissional. Qualquer ligação de caldeirão a bruxo na verdade nada tem a ver com a atualidade, é tão somente uma imagem alusiva a uma dívida da medicina com bruxos – reais em Harry Potter. Historiadores juram que feiticeiros deram sobrevivência à terapêutica com pesquisas sobre plantas especialmente nas trevas do conhecimento ocorridas durante os mais de 10 séculos entre a morte de Cláudio Galeno (129-199) e o despertar do Renascimento (século XIV). Acresce o que Paracelso (1493-1541) – quem disse que prevenida a infecção, a natureza se encarregará de curar as feridas e antecipou por quatro séculos o uso do mercúrio na sífilis – teria dito quando queimou seus livros de medicina: sei o que aprendi com feiticeiras.

É certo que cada vez mais novidades e inovações são acrescidas justificadas com respaldo científico, mas também é certo que a experiência clínica, ideias por analogias e até mesmo acasos continuam legítimos representantes da  tradição da medicina em percentual de tomadas de decisão que resultam eficientes.

A Bioética da Beira do leito entende essencial enfatizar como o olhar leigo sobre evidências científicas no contexto da pandemia atual, ou seja, outras formas de as considerar, exigiu um mergulho para fortalecimento sobre vantagens e desvantagens da medicina baseada em evidências por parte do meio científico para bem se manifestar e se posicionar frente ao que se passou a falar em meios não científicos, a fim de reduzir distorções numa situação tão complexa.

A necessidade de ampliar o conhecimento sobre modos de percepção dada a pluralidade da sociedade tornou-se premente para prover ao discurso e à atuação, uma prudente e zelosa calibragem entre ausência de evidências científicas, gestação de evidências, prematuridade de evidências, evidências recém-natas e ainda aguardando reprodutibilidade e extenso conjunto de evidências.

Bioamigo, sempre mexendo o caldeirão, a vivência crítica bem alicerçada nos desfechos observados diretamente  conduz ajustes de condutas que engrossam a experiência clínica (passado) a ser aplicada a situações análogas (futuro). Um à parte para a conduta ambulatorial abrangendo situações clínicas (ainda) não graves, onde a Bioética da Beira do leito chama a atenção para o apuro no juízo crítico sobre observações de boas evoluções acontecidas quem sabe por causa do uso, quem sabe apesar do uso, razão para motivar pesquisas clínicas sistematizadas sobre benefícios e riscos de métodos.

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