PUBLICAÇÕES DESDE 2014

114-Sou médico ético, logo oriento-me pela Resolução CFM 1974/11


manual

Vocês imaginariam um Hipócrates “comerciante” que tivesse transmitido à posteridade: “… Utilize-se do nosso melhor atendimento, beneficie-se da nossa melhor formação profissional, resultados seguros com qualidade, melhor preço, melhores condições de pagamento, sua satisfação ou o dinheiro de volta!…  Pois é, ultrapassa o limite da imaginação!

Hipócrates foi  MÉDICO e, muito embora nunca seja chamado de Dr. Hipócrates, uma  distinção da imortalidade, o respeito ao seu legado de Ética inspira: “… Numa sociedade consumista, na qual valores, infelizmente, se diluem, a medicina deve atuar como guardiã de princípios e valores, impedindo que os excessos do sensacionalismo, da autopromoção e da mercantilização do ato médico comprometam a própria existência daqueles que dele dependem…”. Este texto faz parte da apresentação do Manual de publicidade médica, Resolução CFM nº 1.974/11, pelo Conselho Federal de Medicina em 2011 http://portal.cfm.org.br/publicidademedica/arquivos/cfm1974_11.pdf.

Dentro do espírito hipocrático, há cerca de 80 anos, a coibição da auto-promoção e do sensacionalismo já  era alvo do Código de Deontologia Médica (1931) num Capítulo sobre Manutenção da Dignidade Profissional. Orientava-se o médico a sempre ajustar sua conduta às regras da circunspeção, da probidade e da honra, constituindo atos contrários à honradez profissional e, em conseqüência, condenados pela Deontologia Medica: solicitar atenção publica por meio de avisos, cartões particulares ou circulares em que se ofereça a pronta e infalível cura de determinadas moléstias; exibir, publicar, ou permitir que se publiquem em jornais ou revistas não consagradas à Medicina, casos clínicos, operações ou tratamentos especiais; exibir ou publicar atestados de habilidade ou competência e ufanar-se publicamente do êxito obtido com sistemas, curas ou remédios especiais.

Desta forma,  semeou-se que  publicidade em causa própria difere de propaganda de idéias de interesse coletivo. Uma coisa é o médico fazer publicidade acerca do método que aplica para que o paciente deixe de fumar, o que pode embutir uma vantagem econômica para si, outra coisa é o médico propagar a conveniência do abandono do cigarro para a saúde de todos, isenta da citada vantagem pessoal.

Destaco o ítem g) do art. 3º  do Manual de publicidade médica recente: É vedado ao médico expor a figura de seu paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo, ressalvado o disposto no art. 10: Nos trabalhos e eventos científicos em que a exposição de figura de paciente for imprescindível, o médico deverá obter prévia autorização expressa do mesmo ou de seu representante legal.

E relembro dois artigos do Código de Ética Médica vigente:

Art. 73 – É vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.

Art. 75 – É vedado ao médico fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos, em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente.

Verificam-se duas atitudes em relação à Autorização pelo Paciente. Na primeira, ela justifica revelar fato e na segunda, ela não justifica expor a figura do paciente ou contar o caso identificado, exceto num ambiente científico, como reuniões clínicas,  a fim de  permitir  melhor  análise  pelos participantes ou em Jornadas científicas pelos objetivos instrutivos.

Assim sendo, uma autorização do paciente para a quebra do sigilo profissional não deve ser um “cheque em branco” a ser preenchido pelo médico para quaisquer propósitos. A solicitação ao paciente ou o atendimento a uma proposição do mesmo para a revelação subentendem uma prestação de serviço ao referido paciente, o envolvimento de um interesse específico do detentor do fato que  faz consentir na veiculação pelo médico.  Um fato pressupõe uma particularidade do caso, não o todo.  É uma informação reduzida que não se presta a generalizações na abdicação pelo paciente do direito ao sigilo profissional.

Na eventualidade, por exemplo, de um paciente internado solicitar ao seu médico expor o prognóstico da situação clínica ao advogado do mesmo, trata-se de um fato “de propriedade do paciente” e cuja revelação  direcionada é do interesse do paciente preocupado com o futuro da família, assim  satisfazendo  o artigo 73 do Código de Ética Médica vigente, cuidando-se para ter certeza de que o paciente está capaz e para o devido registro em prontuário.

Pelas normatizações, já uma eventual  autorização do paciente para que o médico individualize o seu caso na mídia não tem conformidade com a Ética Médica. É a situação, por exemplo, da citação  “consentida” que sai da  boca do médico sobre um atendimento a uma figura pública, o que caracterizaria autopromoção, intenção de angariar clientela e fazer concorrência desleal. Narcisismo desrespeitoso a Hipócrates.

Finalmente, parece útil pela ênfase no sigilo profissional, repercutir o cunho pedagógico dos artigos 74º e 75º do Código de Deontologia Médica de 1931:

Artigo 74º- O segredo pode ser recebido sob duas formas: o segredo explícito, formal e textualmente confiado pelo cliente; e o segredo implícito, resultante da própria natureza das relações dos clientes com os profissionais da medicina. Ambas as formas do segredo são invioláveis, à exceção dos casos especificados em lei.

Artigo 75º- Aos profissionais da medicina é proibido revelar o segredo profissional, fora dos casos estabelecidos pela Deontologia Medica. Não é necessário publicar o fato para que haja revelação; basta a confidencia a uma pessoa isolada. 

Talvez não seja equivocado dizer que todos nós damos umas “escorregadas” em relação ao sigilo profissional, no dia-a-dia. Conversas entre médicos constituem  “cascas de banana”, por exemplo: “… Sabe, ontem  eu atendi àquela celebridade, o Fulano, você conhece né? Fiz o diagnóstico de Dengue, já tinha passado por outros 2 colegas, que não suspeitaram…”.

Fatos são fatos, os do atendimento ao paciente são sigilosos, e isto independe do puro desejo do médico. Pois é do juramento: “… Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto…”.  

 

COMPARTILHE JÁ

Compartilhar no Facebook
Compartilhar no Twitter
Compartilhar no LinkedIn
Compartilhar no Telegram
Compartilhar no WhatsApp
Compartilhar no E-mail

COMENTÁRIOS

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POSTS SIMILARES