Dois símbolos da Medicina. Uma convivência ubíqua. Baixa tecnologia que transcende especialidades médicas. Antes do estetoscópio, a ausculta direta (… se você escutar colocando o ouvido no peito…
Hippocrates “De Morbis”- 400 a.C.). Antes da identificação dos ruídos de Korotkoff, uma noção da pressão sistólica, tão somente.
A dupla persiste imprescindível em meio a tantas máquinas recém-incorporadas ao cotidiano das boas práticas. Não há dúvida, estetoscópio e esfigmomanometro motivam abrir o baú da História da Medicina.
O médico francês René Théophile Hyacinthe Laënnec viveu 45 anos (1781-1826). Hipocondríaco, depressivo e sofrendo de tuberculose – sua causa mortis. Foi aos 35 anos de idade (1816) que Laennec inventou o estetoscópio.
Nenhuma prancheta, nenhuma indústria, gasto mínimo de matéria prima, nenhuma avaliação de custos, nenhum protocolo de validação. Foi, simplesmente, a recordação de criança. Ele gostava de aproximar um graveto ao ouvido e ouvir o som propagado do arranhar a outra ponta.
Diante da dificuldade de aproximar o ouvido do peito de uma gestante obesa com mamas muito desenvolvidas, Laënnec enrolou papel em forma de canudo e, assim vinculado, criou o símbolo da relação médico-paciente (…Imediatamente enrolei folhas de papel em forma de cilindro bem apertado, encostei uma ponta no tórax da gestante, me inclinei e apoiei o meu ouvido na outra. Pude perceber a ação do coração de uma maneira muito mais clara e distinta do que fora capaz até então pela ausculta direta…”). http://publicacoes.cardiol.br/caminhos/014/
A estetoacústica suscitou a confecção de uma peça cilíndrica em madeira monoauricular. Médicos de vários países foram a Paris aprender o novo método do cilindro. Eles retornavam a seus consultórios com a novidade no bolso. Logo aconteceu a cilindromania. A população passou a preferir ser examinada pelos que usavam o “cilindro importado”. O estetoscópio nasceu com o status de instrumento de boas práticas.
Passemos do século XIX para os primeiros anos do século XX. Da paz francesa para a guerra entre Rússia e Japão. O personagem aqui é o médico russo Nikolai Sergeyevich Korotkoff que viveu por um número de anos semelhante a Laennec (1874-1920) e cuja causa-mortis foi tuberculose pulmonar também. Korotkoff foi para os campos de batalha na Manchuria como cirurgião vascular. Ele estava interessado em fístulas arteriovenosas causadas por arma de fogo. Na bagagem levou o esfigmomanometro rudimentar criado pelo médico italiano Scipione Riva Rocci (1863- 1937).
Korotkoff tornou-se epônimo dos ruídos do exame da pressão arterial ao constatar, aos 31 anos de idade, variações acústicas associadas ao grau de compressão do manguito sobre a artéria braquial (…Inicialmente não se ouve nenhum ruído, depois aparecem os primeiros tons curtos que é a pressão máxima, após outros tons há silêncio, é a pressão mínima…).
A pressão diastólica tornara-se mensurável! Korotkoff, de volta a Moscou, fez experiências em animais para provar que os sons eram produzidos localmente e não eram provenientes do coração como seus críticos – sempre eles- afirmavam.
Foi o neurocirurgião Harvey William Cushing (1869-1939), outro epônimo, quem levou o esfigmomanometro de Riva Rocci para centros cirúrgicos dos Estados Unidos da América e, de modo pioneiro, aplicou os achados de Korotkoff para controlar a pressão arterial sistêmica de seus operandos.
Dois cenários europeus de inovação, única aliança mundial “eterna”!