PUBLICAÇÕES DESDE 2014

HM36- O mundo real baseado em evidência

MBE
Crédito: CMAJ. 1995 Jan 15; 152(2): 201–204

A Medicina baseada em Evidência já ultrapassou duas décadas de vida em sua trajetória de educação médica continuada. Ela conjuga: a) decisão clínica sustentada pelas melhores evidências científicas disponíveis; b) a necessidade clínica mais do que hábitos e protocolos devem nortear o tipo de evidência a ser rastreada; c)  a identificação da melhor evidência inclui o pensamento de ordem  epidemiológica e bioestatística; d)  as determinações fundamentadas de modo crítico nas evidências são aplicáveis apenas para condutas em pacientes e tomadas de decisão em saúde; e) os resultados desta modalidade de aplicação da Medicina devem ser constantemente avaliados.

O novo paradigma pretendia desvalorizar a aplicação da intuição, a experiência clínica não sistematizada e a racionalidade fisiopatológica e acrescer mérito translacional aos estudos científicos controlados rigorosos.

Segundo David Lawrence Sackett (1934-2015) considerado o Pai da Medicina baseada em Evidência, o novo paradigma combinava evidências da pesquisa com habilidades clínicas e valores e preferências do paciente e, assim, permitir discutir opções com o paciente. Ela permitiria dar suporte aos experientes e empoderar os jovens médicos. Ele próprio entendia, neste contexto, que após 10 anos de efetiva atuação, um especialista deveria parar, pois seus pontos de vista tornaram-se tão aderidos para permitir a entrada de novos tipos de pensamentos.

Contudo, com o passar dos anos, Sackett sentiu-se desgostoso com a criação do termo “Sacketização” para expressar uma ligação artificial de  publicações com a Medicina baseada em Evidência com o intuito fundamentalmente comercial, aumentar vendas de livros”. Assim, Sackett  renunciou, no pico da glória, a “… escrever, ministrar cursos e atuar como árbitro em temas relacionados a Medicina Baseada em Evidências, em 2000… a única redenção do pecado da competência profissional que conheço é a aposentadoria no seu campo e derivar a sua capacidade intelectual para novas áreas, onde, tendo se desprendido da maior parte do prestígio e sem afirmações pessoais para defender, aproveite da liberdade de debater novas evidências e idéias sobre os seus méritos passados… porque muitos especialistas são sugados para buracos negros, como funções administrativas, nas quais há menos chance de influenciar o progresso da ciência… a ligação do meu nome a um vínculo artificial de uma publicação ao movimento da Medicina Baseada em Evidências com a finalidade de promover vendas – sackettização – feriu meus sentimentos e ganhou minha desaprovação… pareceristas parecem não resistir à tentação de aceitar ou rejeitar novas evidências ou idéias não pelo mérito científico das mesmas, mas pelo quanto concordam ou discordam de posições públicas dos especialistas nas matérias… assim novas idéias e novas investigações são obstadas por especialistas e letifica-se o progresso em direção à verdade…”.

Este comportamento de Sackett que reflete que dignidade não é para ser defendida, é para nos defender (Ralph Waldo Emerson, 1803-1882), representa uma lição sobre a modéstia necessária dos intelectuais (cientistas) e uma advertência para os especialistas (saber técnico). De fato, a Sackettização floresceu como uma “indústria do conhecimento numa comunidade da verdade”, em que as regras constituídas permitiram uma “expansão para o mercado” segundo uma moral própria sobre a concepção de “melhor evidência”, ou seja, maior número de especialistas para “consumir” e nem tantos cientistas para produzir e disseminar o conhecimento.

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