É essencial. Pacientes precisam sentir-se seguros com os médicos que os assistem quer já compartilhem um passado, quer tenham acabado de se conhecer. É aspecto clássico da relação médico-paciente. Acontece, todavia, que as acentuadas transformações no exercício da Medicina na segunda metade do século XX substituíram grande parte da simples interação entre duas pessoas bem identificadas- o Dr. A cuidando do paciente B- por uma expansão de ambientes e de partícipes profissionais com maior ou menor grau de visibilidade.
As ramificações do atendimento no tempo e no espaço cumprem objetivos primários. Elas ampliam as chances de obtenção de benefícios de uma Medicina expandida em especialidades e sub-especialidades. O repartir de conhecimentos e de habilidades dos métodos avoluma, contudo, as oportunidades de comprometimento da segurança do paciente. É estatístico.
A Bioética da Beira do leito trabalha com a complexidade, a pluralidade e a diversidade das relações interpessoais, redes íntimas que agregam várias máquinas. Claro, simplicidades clínicas continuam a existir. Muitas resoluções das mesmas bastam na singela composição singela de um paciente-único médico. Não obstante, elas ficam sujeitas a pensamentos enviesados de natureza ética e legal, assim correndo o risco muitas de desembocar na preocupante Medicina Defensiva. E , por isso, o simples pode virar complexidade.
A Bioética da Beira do leito reconhece que as complexidades naturais e construídas envolvem-se com movimentações de atendimentos exigentes de um pensamento sistêmico. Sem dúvida, os holofotes deslocam-se desde o médico isolado e suficiente e iluminam um conjunto de profissionais, uma quantidade de ferramentas, outros contextos de abordagem de sintomas e de sinais clínicos. As luzes precisam dar visibilidade de conduta a novas formas de uso na beira do leito da informação, da organização, da percepção dos componentes que retroalimentam responsabilidades com o todo.
Neste contexto, as adversidades ganharam destaque sob várias modalidades. Há a adversidade probabilística dos 5% de insucesso que complementam os 95% de sucesso previsto, há a adversidade biológica do comprometimento de uma função pelo agente que beneficia uma outra função, há a adversidade paradoxal em que o efeito acentua a causa – resistência antibiótica, por exemplo.
O pensamento sistêmico é especialmente útil na formulação de estratégias do tratamento farmacológico pelo potencial de ocasionar deslises e enganos. Deslises são lapsos inconscientes, involuntários, que ocorrem, qual distrações, num ato praticado no automático. Enganos referem-se a escolhas incorretas, por insuficiência de informação, conhecimento, formação, treinamento. Ambos convergem para questionamentos de erro profissional, termo que é melhor do que erro médico, pois, com frequência ele está ligado a algum elo -ou mais de um- organizacional.
O erro profissional ligado a fármacos pode ser classificado em cinco categorias:
- Houve o erro, mas ele não atingiu o paciente;
- Houve o erro, ele atingiu o paciente, mas não causou dano, ou há necessidade de um monitoramento para acompanhamento se ainda acontecerá o dano;
- Houve o erro e causou um dano temporário que pode ou não ter prolongado o período de cuidados;
- Houve o erro que causou um dano permanente, necessitando ou não de cuidados intensivos;
- Houve o erro que provocou ou contribuiu fortemente para o óbito do paciente.
A valorização do pensamento sistêmico é fator relevante da prevenção do erro profissional.