Em tempo de efervescência política parece interessante relembrar o psicólogo americano Rollo May (1909-1992). Ao tratar da triangulação poder, inocência e violência, no livro Poder e Inocência- editora Artenova, 1974 – ele refere que quando a auto-afirmação (crer no seu valor) falha, o passo seguinte é o uso de seus poderes (auto-reconhecimento) para enfrentar oposições e sendo insuficiente, a reestruturação do poder caminha para a agressão, que é ato de entrar no território do outro: “aqui estou eu, você pode chegar até este ponto, não mais”.
May conceitua o poder como a capacidade para causar ou impedir mudanças, o que pode ser exercido como poder latente- possibilidade no futuro- ou poder em ação. Ele apresenta 5 modalidades:
- Poder explorador- Ligado à força.
- Poder manipulador- Poder sobre outra pessoa. Vale-se de fraquezas, necessidades, ansiedades.
- Poder competitivo- Poder contra alguém. Ele pode ser exercido para fazer o outro cair a fim de subir sem os méritos necessários, ou por meio de uma rivalidade estimulante e construtiva.
- Poder nutrício- Poder para o outro. Figura paternal direcionada para o bem-estar.
- Poder integrador- Poder com a outra pessoa. Formula-se uma tese, deseja-se ouvir uma antítese, resulta uma síntese.
Direcionando para a beira do leito, a auto-afirmação do médico é essencial, sentimento de valor, narcisismo benigno, crer em si, estar consciente que desenvolveu um ser médico que reconhece autêntico e capacitado a cuidar das necessidades do paciente sem o uso de nenhum tipo de violência perante a vulnerabilidade.
Já o auto-reconhecimento lida com o poder de ser contra o não-ser. Frente a uma oposição, é preciso ultrapassá-la, o que coloca a beira do leito num cenário institucional (uso do poder pessoal para reinvidicar infra-estrutura), num ambiente de sistema de saúde (uso do poder pessoal para a conciliação de interesses) e num clima de relacionamento de profissional da sáude com demais ou com paciente/familiar (uso do poder pessoal em prol da harmonia).
A adoção do princípio da autonomia repudia a agressão da coerção, da submissão a um procedimento sem o estabelecimento bilateral de limites. O atendimento às necessidades do paciente não é simplesmente a junção de dois monólogos, o do fornecimento de fatos e de dados pelo mesmo e o da atuação técnico-científica sobre os mesmos pelo médico, é essencial aclimatar na emissão e na recepção bilateral, o diálogo do acolhimento e do esclarecimento.
A Bioética da Beira do leito rejeita a exploração que embute conflitos de interesse e a manipulação que se vale da vulnerabilidade do estar doente. Por outro lado, aprecia a competição construtiva, a alimentação do bem-estar e a excelência na constante discussão de validações de eficiência.