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1651- Autonomia e heteronomia no ecossistema da beira do leito (Parte 17)

Um fio condutor da Bioética da Beira do leito é o esforço de transformar as tensões dos conflitos em energia produtiva de conciliações cuidando para a preservação da empatia, interesse por compreender motivações e liberdade para expor e defender posições e valores. Assim, compromissada com a autenticidade de envolvimento, consciente que a legitimidade de autoridade requer um contexto pluralista, ciente do préstimo da humildade epistêmica e da competência cultural que inclui expertise em linguagens disciplinares e pelo propósito de transitar por divergências e facilitar o diálogo inclusivo e confiável entre as diferenças com visão transdisciplinar destaca que é essencial médico e paciente identificarem os pontos precisos de eventual desacordo no âmbito da  conduta, reconhecer incertezas e aceitarem  procurar uma solução construtiva de natureza técnica, social e ética com boa fé e respeito mútuo acerca de narrativas, emoções e identidades.

Combinações de autonomia e heteronomia favorecem as “realidades de fins” em que todos se respeitam como agentes morais e livres, dentro da máxima kantiana (Immanuel Kant, 1724-1804) de trate cada ser humano como um fim e não como um meio. O prontuário do paciente elaborado pelo médico é o fiel depositário que documenta tanto a constituição heteronômica da conduta baseada em diretrizes clínicas quanto a resposta autonômica do paciente a respeito do consentimento para a submissão.    

A Bioética da Beira do leito relembra que diretriz clínica foi inicialmente denominada de consenso sobre determinada doença. A correção deu-se não somente porque muitas orientações são decididas por escores de votação dos membros do Comitê organizador do tipo 5 a 4, como também, porque o recomendado não deve ser uma algema e sim uma bússola. Muito embora o médico não escape do dito por Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) que o homem nasce livre, mas está sempre acorrentado, o imperativo do humanismo cuida para não ultrapassar a fronteira nem sempre clara do cientificismo e do tecnicismo. É preciso ter em mente que quem cria a linguagem cria os valores, obtém um tipo de poder que precisa ser entendido como necessário mas não absoluto.

A Bioética da Beira do leito reafirma o valor de um atento espírito reflexivo que faz o médico vivenciar o benéfico estado do “se redescobre”  sequente alinhado a análises críticas dos emaranhados de expressões pessoais internas e execuções das exterioridades coletivas manifestas  em cada caso, haja vista que eles se formam em acelerada sucessão e se sujeitam a interpretações divergentes.

Exemplo é a hierarquia do direito à autonomia pelo paciente em situação de conduta eletiva e da imperiosidade da aplicação da heteronomia pelo médico perante o risco iminente de morte evitável (emergência). Acresce que dificuldades de bem posicionar a evolução da situação clínica no critério de já iminência de morte evitável acontecem com relativa frequência. Antecipar-se pode redundar numa interpretação de imprudência, atrasar-se na de negligência. 

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