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1659- Autonomia e heteronomia no ecossistema da beira do leito (Parte 25)

       2e- Implica na verbalização de Sim doutor representar um Sim de absoluto respeito e de Não doutor um Não de absoluto respeito, ou seja, perante o Não doutor, eventual aplicação será uma imprudência profissional e perante Sim doutor, eventual não aplicação será uma negligência profissional. Contudo, existe também o Talvez doutor.

             2f- O Talvez doutor pode ser mais ou menos explícito de uma ambivalência em curso. Ele se manifesta tanto na chamada autonomia intrínseca que subentende um forte domínio da decisão por parte do paciente capaz, quanto que na chamada autonomia de relação em que há maior influência dos circunstantes  – familiar, amigo, colega, outro paciente. 

          2g- O Talvez doutor e a possibilidade de mudança de opinião SimNão indicam que o direito do paciente capaz ao exercício da autonomia pode se associar a um caráter provisório. Expressões de indecisão trazem à tona discussões sobre a conveniência do paternalismo profissional. Ele foi demonizado como antítese da autonomia  pelo paciente, mas logo se percebeu que deveria ser subdividido numa vertente de fato intolerável relacionada à prática coercitiva – paternalismo forte – e numa admissível vertente de compreensão e reesclarecimento passível de reverter sem coerção ou fortalecer um Não doutor – paternalismo brando.

        2h- O valor moral do posicionamento discordante do paciente capaz está embutido no direito à plena manifestação do não cumprimento, por isso, o médico necessita ser cauteloso em juízos críticos a serem manifestados ao paciente a fim de os conter nos limites das apreciações tecnocientíficas e predisposto sempre que possível à abertura e à tolerância, bem como a preservação da conexão médico⇔paciente mesmo em ausência do que poderia entender como melhor conduta. A virtuosidade do desempenho perante a negação do paciente capaz é um capital ético valioso na contemporaneidade do exercício da medicina no ecossistema da beira do leito.

     2i- O Estatuto da Criança e do Adolescente  brasileiro inclui a opinião e a expressão no direito à liberdade de crianças (até 12 anos) e adolescentes (até 18 anos). A Bioética da Beira do leito interessa-se pela qualidade com que a progressão etária acompanha-se do desenvolvimento da capacidade de efetivar preferências. desejos, objetivos e valores a respeito de orientações/recomendações médicas, especialmente na adolescência. Aspecto principialista de relevância é o quanto antecipações da maioridade civil aos 18 anos podem ser interpretadas como adequadas  – ideia de adolescente amadurecido – numa autônoma manifestação decisória de Sim doutor ou Não doutor.

O racional desta “maioridade moral” é a visão do período de adolescência como preparação para a vida adulta em aspectos psicológicos, emocionais, físicos e sociais  que objetiva autoridade e responsabilidade e que inclui a gestão da própria saúde. Inserir-se no processo de tomada de decisão diagnóstica, terapêutica ou preventiva é oportunidade pedagógica para o adolescente a respeito não somente da existência na sociedade do direito de exercer a autonomia, como também da qualidade do seu conhecimento sobre os próprios processos cognitivos (metacognição) de que necessita para pensamentos e deliberações.

O apoio da  Bioética da Beira do leito ao conceito de graus de validade da voz ativa do adolescente alinhados ao  entendimento da adolescência como período de transição da criança para o adulto embute a pertinência da flexibilidade na visão da linha de corte da maioridade civil aos 18 anos em processos de tomada de decisão do menor de idade no ecossistema da beira do leito quanto à participação nos próprios interesses da saúde. Afinal, não parece plausível considerar que às 0h01do dia de completar 18 anos de idade a competência cognitiva, o relacionamento entre mim e mim mesmo, mude radicalmente em relação a presente às 23h59 da véspera distinta, tal como um efeito Cinderela reverso!

Parte 26

     2j- A instituição das Diretivas Antecipadas de Vontade (Testamento vital) trouxe mais uma representação do passado para a expressão do direito à autonomia. Por meio dele, a incapacidade cognitiva do momento não mais impede a livre escolha sobre condutas médicas, especialmente em consentimentos ou não de submissão a métodos na terminalidade da vida.

 3- Ditames da consciência do médico –  A Bioética da Beira do leito alerta que o direito do paciente capaz de se manifestar livremente sobre condutas não subjuga o direito do médico de se recusar a aplicar uma proposição tecnocientífica inócua ou danosa para o paciente e/ou moralmente inaceitável a ele proposta. A Bioética da Beira do leito complementa orientando o médico a ouvir sua consciência e a dar atenção a eventual entendimento de  objeção de consciência.

Em suma, recomendação médica isenta da emergência representada pela iminência de morte evitável é uma bússola, não uma algema para o paciente capaz. Ela pode ser descumprida pelo paciente capaz, quer por ocasião da instalação da conduta diagnóstica/terapêutica/ preventiva recomendada, quer no decorrer da mesma (revogação do consentimento). A decisão negatória significa assumir responsabilidades com sua qualidade de vida e prognóstico de sobrevida.

 

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