Foi um cenário instigante, aqueles minutos tensos motivaram o médico a sair da zona de conforto dada pelo passo-a-passo sereno dos algoritmos fornecidos pelas diretrizes clínicas e proporcionaram ampliação da visibilidade sobre ser/estar/ficar médico. Pois é, o médico tem mais intimidade com as complexidades dos métodos diagnósticos, terapêuticos e preventivos do que com os meandros das atitudes. A razão? Basicamente o treinamento, o currículo da graduação e a estrutura da pós-graduação.
A enfermaria era frequentada por recém-formados de várias profissões da saúde em busca de modelos de atuação e pelo jeito, acostumavam fácil, ajustavam suas individualidades ao profissionalismo no entorno do ganho de saber, entendendo que a aquisição de novas bagagens significa desfazer-se de antigas na viagem do leigo para o profissional. Tornar-se melhor, não necessariamente o melhor, mas colocar-se entre os melhores. Seguir o conselho de Dédalo para Ícaro que a cera da vaidade derrete-se à realidade do sol, razão para um bom estoque de paciência para superar as dificuldades sem metas de perfeição, tão somente visando à excelência.
O profissional da saúde lúcido não é antônimo de pessoa leiga pois a amplitude da ciência que lhe diz respeito impede que domine todos os aspectos e as lacunas do que não sabe lhe proporcionam um componente leigo. Já foi o tempo do médico que atuava em distintos ramos da medicina, atualmente, a restrição já se materializa por escolha pessoal de especialidade e área de atuação. Há liberdade do jovem de seguir sua afinidade com a parte da medicina independente de eventuais necessidades locais.
O envolvimento no “não treinado/em treinamento” é espinhoso e sujeito a cefaleias profissionais e, paradoxalmente, estes incômodos são forças motrizes para transformar os ainda não desejados desempenhos em “bons e velhos amigos”. Percebi que minha bagagem plural podia se alinhar à rotina do médico para facilitar conhecer os avessos e seus percalços para lidar com o lado direito. Um avesso natural na conexão médico-paciente é o medo do paciente de se submeter. Respeitá-lo não é o médico postar-se de modo indiferente – então tudo bem-, mas, ativa e interessadamente ajudar o paciente a encontrar meios para a superação. Um período de tempo para o paciente se refazer de um nocaute emocional pela “má notícia” ou uma sugestão para procurar uma segunda opinião têm o potencial de reverter o avesso para o lado direito.
Entre um susto e outro por alguém vir pegar um equipamento do conjunto que me escondia, prossegui pensando que o mais comum, o consentimento dado pelo paciente. é um óbvio, caso contrário a medicina não persistiria. Não é difícil de se prever, pois ocorre, não somente, porque o paciente sente-se doente, como também, porque fica esclarecido sobre o bem que a conduta deverá lhe proporcionar. O consentimento, que muitas vezes transforma-se em exigência premente, representa a chance de subtrair o des do desespero e ficar apenas espero em ambos os lados da conexão médico-paciente. O Sim, doutor faz a prudência utilizada no processo de tomada de decisão ser sucedida pelo zelo na execução da conduta consentida. Imprudência e negligência são dois comportamentos eliminados “de fábrica” na minha constituição de robô.
O ato do não consentimento pelo paciente é uma verdade absoluta, o prosseguimento da realidade da história natural mórbida que os médicos antepassados tanto estudaram anotando sintomas e sinais e organizando as doenças pelo que encontravam à necropsia. Já o consentimento pode se materializar como uma ilusão de verdade, um efeito do relaxa, vai tudo ficar bem tão necessário, tão otimista e tão angustiante.