Avaliações atuais indicam o paradoxo do alto progresso tecnológico aplicável à beira do leito ter provocado a premente necessidade do simbolismo do quadro The Doctor (1891) de Lukes Fields (1844-1927) que representa a presença muito humana do médico mas, à época, pouco eficiente.
A intelectualidade, os conhecimentos, as habilidades, os recursos diversificados, as intenções pelo benefício/não benefício não são profissionalmente suficientes? Por um ângulo pragmático podem ser. Uma conduta baseada na medicina validada seria considerada ética porque a aplicação traz o potencial da resolução. Todavia, já está bem sedimentado que valores envolvidos na captação variam de paciente para paciente, de situação em situação.
O julgamento moral relacionado ao entendimento de utilidade traz uma dissociação entre a execução da medicina e do médico em relação às conexões com a individualidade do paciente. De certa forma, a medicina alinha-se a uma ética de promoção da maior quantidade possível de benefício/não malefício, enquanto que uma moralidade – comportamento do médico em função de valores propostos pelo paciente- privada carrega alta exigência de consideração.
A medicina baseada em evidências (antecipações qualificadas por pesquisas, vivências de especialistas) valoriza o útil e eficaz. O médico baseado em competência (conhecimento, habilidade e atitude) precisa ajustar utilidade e eficácia desejadas pelo paciente.
Sob aspecto prático, pode-se configurar uma sequência iniciada pelo estabelecimento de uma Conduta Recomendável afinada com o princípio da Beneficência e interligada à medicina baseada em evidências, harmonizada ao princípio da Não maleficência numa Conduta Aplicável (àquele paciente especificamente) e por fim filtrada pelo Princípio da Autonomia na voz ativa do paciente sobre consentimento ou não da aplicação numa Conduta Consentida – ou não.
Esta dinâmica articula-se com o zelo e a prudência, dois itens essenciais da Responsabilidade profissional – É vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
A Bioética da Beira do leito preconiza que a rota Conduta Recomendável- Conduta Aplicável- Conduta Consentida enquadra-se na Prudência, ética e virtude que supõe incertezas, riscos, acasos, desconhecidos apesar das seleções validadas do que deve ser disponibilizado e do que deve ser evitado fruto do adrede observado e adotado. Desvios, abusos, desatenções na fase de planejamento são imprudências- habitualmente, fala-se, equivocadamente, como sendo negligências, porque o zelo refere-se á qualidade com o consentido.
Perante um não consentimento, o não fazer é prudência. Uma cautela que deve estimular um repasse da situação com o paciente – Paternalismo brando- a fim de não deixar pontos obscuros na recomendação e, também, compreender as eventuais objeções. A Bioética da Beira do leito entende que percentual expressivo de não consentimentos pelo paciente é de natureza provisória, ou seja, o exercício da prudência “paternalista branda” tem o potencial de transformar o médico num fator conciliador entre a “medicina para a doença” e a “medicina pelo doente”.
Inquietudes com a moral orientada para a ética em condutas médicas têm ênfase tanto nas práticas em si (objetivação) como na subjetivação, o que, invariavelmente, gera possibilidades de momentos de justaposições e de conflitos. A Bioética propõe-se a auxiliar médico e paciente a ambos representarem cada qual a seu modo sujeitos morais no ecossistema da beira do leito.