A Bioética da Beira do leito estimula os sentidos de liberdade para a crítica, da autenticidade na atuação e da transformação consciente, que, habitualmente acompanham-se de tensão provocada pelo paradoxo de entender-se livre para manter-se bem preso à honestidade pessoal e às legitimidades profissionais.
No cenário de uma sociedade organizada para atender às necessidades de saúde da população, justapõem-se duas comunidades de interpretação, a do profissional e a do paciente. Admite a expansão para a beira do leito do conceito de comunidade de interpretação, cunhado por Stanley Fish (nascido em 1938), como um grupo de indivíduos que se constituem pelos modos compartilhados de enxergar o que acontece e de prover atitudes.
O aproveitamento para a beira do leito da ideia de certo padrão para partilhar subjetividades em dada circunstância facilita considerar modos de pensar de ambas comunidades citadas, os propósitos alinhados com o que soa fazer sentido para o momento articulados conforme fatores intervenientes. De modo reducionista, a dor e o sofrimento por parte do paciente interagem com a responsabilidade na aplicação da tecnociência por parte do profissional.
A Bioética da Beira do leito entende a necessidade de um treinamento para que o íntimo do profissional da saúde adquira condições de adaptação ao manifesto no (a)caso da beira do leito sem violações éticas/morais/legais. Exemplo marcante é a situação do não consentimento pelo paciente a recomendações médicas altamente influenciadoras do prognóstico clínico.
A eventualidade de não poder fazer o que faz sentido para si, o que aprendeu e apreendeu que é o indicado a fazer/não fazer, mexe com a vocação, provoca uma sensação de ilegitimidade de atuação, tornam sem préstimo as mediações que incorporam as normas da profissão à identidade pessoal objetivando o papel social. Não é fácil para o profissional da saúde calibrar O que sou! com o O que faço! no mundo real da beira do leito com dificuldades de conciliação entre os exercícios da beneficência e da autonomia.
Ocorrem muitas significâncias na comunidade de interpretação do paciente, que por serem em princípio leigas, diferenciam-se das observadas na comunidade de interpretação do profissional da saúde. Elas carregam mais liberdade de manifestação, mais soberania individual, não importa se mais calcadas em emoções e crenças do que em objetividades para manifestar tipos de desejos, preferências e objetivos, bem como para justificar em função de valores introjetados.
A Bioética da Beira do leito enfatiza que as inter-relações entre o sentido teórico e a função prática para produzirem compartilhamentos na conexão profissional da saúde-paciente precisam ser atapetadas pela prudência- ética e virtude.
A cautela profissional inclui seleções entre pretendidos pelo paciente em função do direito à autonomia e exigências heteronômicas da profissão, padronizações, mais feedback com a cultura vigente e menos carisma, como o respeito ao É vedado ao médico, caput da maioria dos artigos do Código de Ética Médica vigente.
É essencial para lidar com as angustiantes sensações de que a função prática possível conforme consentida pelo paciente estaria na contramão do sentido vocacional ou que este não satisfaz àquela.
A realização do que se fixou vocacionado como imperativo profissional, o ser pelo fazer, a reunião da identidade com a missão, exigem atividade produtiva. As potencialidades da beneficência e da não maleficência só têm chance de se realizarem quando há o consentimento pelo paciente como expressão do respeito a sua voz autônoma.
A Bioética da Beira do leito pode cooperar para o encontro das conformações responsáveis para os (a)casos da beira do leito que possam equilibrar o que vem de dentro do profissional da saúde e o requerido pelos papéis individualizados.