Bioamigo, voltando ao aspecto prático, você há de concordar que a manifestação clínica é essência no modelo clássico de atendimento a um paciente, habitualmente onde tudo começa.
Por isso, persiste válido o chavão a Clínica é soberana tão decantado por nossos colegas antepassados que contavam fundamentalmente com seus órgãos dos sentidos apurados e raciocínio estruturado. Evidentemente, hoje ele representa menor proporção dentre os recursos aplicados na beira do leito e um reduzido amparo em tomadas de decisão difíceis.
A soberania da clínica aliou-se à soberania disciplinar hospitalar e neste início de século XXI, consolida-se a soberania do paciente. Sua validade como expressão de agente moral no processo decisório é notória. O paciente está mais participativo/colaborativo do que há poucas décadas quando era apenas um corpo manifestando queixas e objeto de exames.
A forma de enxergar a tecnociência para a sua vida tornou-se poderosa, um vigor representativo que fortalece a beira do leito como cenário onde um ser humano cuida de outro ser humano – O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional (Princípio fundamental II do Código de Ética Médica 2018).
A Bioética da Beira do leito entende, por tudo isso, que a autoridade da tecnociência validada para interagir com legitimidade sobre os aspectos clínicos do paciente fica obrigada a passar por certos filtros de conhecimento e de atitudes. Uma das filtragens necessárias é pela prudência sobre a alta concentração de suspensões de possibilidades de incertezas, de riscos, de acasos e de desconhecimentos no ambiente da beira do leito.
A eficiência do filtro da prudência requer crivos finos forjados na tríade de contexto principialista da Bioética: beneficência do método, segurança da não maleficência e respeito à pessoa do paciente articulada à autonomia. Não é sem razão que o artigo do Código de Ética Médica que se refere à imprudência – É vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência – foi guindado de Art. 29 para Art. 1º em 2010, o que realça o valor do bom-senso, da moderação, da fidelidade, da coragem e da justiça na beira do leito contemporânea.
Bioamigo, na beira do leito estamos constantemente transitando por pontes entre diferentes tempos que não percebemos devido à aparente linearidade da inclusão dos progressos tecnocientíficos. Já os reajustes éticos são mais perceptíveis, as atualizações são em menor número, assim como aqueles que fazemos para dar um bom-tom, um decoro com mais sintonia com as atualidades da sociedade.