Bioética. É palavra que desconheci durante bom tempo. De repente, surgiu diante e incorporou-se ao meu profissionalismo. Tornou-se ativa na memória e assim passou a estar representada no meu cotidiano da beira do leito. Um neologismo que foi adsorvido na atmosfera técnica com notável senso prático e crítico e, atualmente, harmoniza-se com as mais relevantes tradições das ciências da saúde.
Aliás, não é equivocado pensar que o espírito da Bioética esteve sempre presente nas entranhas da medicina desde que Hipócrates (460ac-370ac) privilegiou o bem/não mal (primum non nocere). Uma passagem pela história da medicina permite enxergar aspectos da Bioética em várias situações impactantes, o que evidencia que não se trata de uma cultura manufaturada. Há naturalidade projetada do passado que carrega um sentido de senso comum.
Por isso, a Bioética da Beira do leito entende que a Bioética revelou-se das profundezas do profissionalismo em ciências da saúde após uma forte conscientização de tendências para desvios do bem/não mal para a humanidade da sucessão inovadora de cogitados para beneficiar a qualidade de vida e a sobrevida do Homo sapiens.
Depois que nos tornamos afeiçoados à Bioética, cônscios da forte influência positiva autossignificante, ocorre algo tão enigmático quanto atraente, não dá para parar de pensar no leque de contribuições da Bioética. É característica alinhada ao otimismo de uma visão voltada para o significado de copo cheio, metáfora para critério de tema instado à celebridade.
Curiosamente, se o conceito de celebridade foi desenvolvido no século XX tendo como ponto de partida a fotografia surgida no século precedente e que permitiu às pessoas olhar suas imagens que não num espelho, a Bioética aproximou-se do contexto de uma individualidade própria quando o progresso da medicina passou a suscitar novas representações do ser humano por mecanismos abióticos de alto poder de transformação do status quo. A Bioética introjetou a crítica à confiança e daí projetou renome. Não são muitos seguidores como poder-se-ia conjecturar pelo valor agregado, é verdade, mas o nível de fidelidade é precioso.
Depois de capturado pelo poder da oportunidade empática e convincente, é risco anunciado, dificilmente acontecerá um afastamento mental da Bioética. Nesta hipótese, certamente terá ocorrido tão somente um flerte descompromissado.
A militância em Bioética tem como referência incitante a participação ativa num Comitê de Bioética, fonte de motivação para o descortino de horizontes, perspectivas e propósitos. Direcionamentos voltados para a busca da verdade, não exatamente da certeza – o caminho, mas não o destino-, mas nunca descompromissada com o rigor. Ginástica de neurônios! Prescrição para a saúde psíquica.
Por outro lado, ouvi o termo polimatia pela primeira vez quando o professor Luiz Vènere Décourt (1911-2007) instruiu-me como meu orientador sobre o concurso para livre-docência na FMUSP. Soube que deveria me esforçar para não me restringir a manifestar conhecimento tão somente de cardiologia, mas que deveria ampliar para demais assuntos da medicina.
Compreendi o conselho, dediquei-me no âmbito da minha capacidade, creio que de alguma maneira apresentei-me com um grau de abrangência articulado com a recomendação do mestre. Mas, alguns anos depois, percebi que o professor Décourt havia despertado em mim algo que contribuiu sobremaneira para a receptividade às essências da Bioética.