Todas áreas médicas possuem desafios. Algumas provocam grandes dilemas. Estes podem ser imediatos como os enfrentados por cirurgiões no campo operatório ou podem ser mais reflexivos como os vivenciados na oncologia, onde decisões terapêuticas convivem com reflexões sobre jornadas dos pacientes, suas experiências, suas relações profissionais e pessoais, suas fontes pagadoras e, finalmente, a luta contra o tempo.
Além destes dilemas, os rápidos progressos da ciência médica com sucessivos ganhos no diagnóstico e conhecimento biológico do câncer, na avaliação de sua extensão com “brilhantes” máquinas, na adoção de novos tratamentos com custos proibitivos e muitas vezes ganhos discutíveis para os pacientes, têm gerado potenciais crises nas relações entre profissionais de saúde e todo conjunto que compõe a complexa abordagem do câncer.
Não é por acaso que na década de 60 do século passado teve início a estruturação dos estudos sustentados na Bioética para conciliar os vários componentes deste caldo cultural e existencial.
De modo simultâneo à Bioética e, talvez, tenha sido seu agente causal, o direito à autonomia dos pacientes passou a ocupar espaço cada mais abrangente na relação médico-paciente. Em consequência, o Não é Não, inclusive na oncologia.
Exceto para procedimentos de extrema urgência, uma decisão terapêutica passa por um processo trabalhoso de raciocínio onde são pesados os prós e contras na sua adoção. A análise profissional na oncologia deve ser cuidadosa não apenas a respeito da patologia que aflige o cliente, mas também sobre suas condições familiares, sócioeconômicas, crenças, relações com outros profissionais que tenha consultado, disponibilidade para novos e sacrificados procedimentos, enfim, a consideração sobre perspectivas de ganhos na sobrevida e seus custos em função do sofrimento terapêutico.
Como avaliar todos estes pontos levantados com as máquinas “brilhantes” que propiciam parte da escolha por um procedimento terapêutico? Seguramente, não fazem e não farão. A decisão do paciente pelo Sim, na oncologia, passa pela relação de confiança entre o paciente e sua equipe médica. A confiança, o estar junto, o pensar em uma mesma direção é algo a ser conquistado durante uma ou várias consultas quando a anamnese deve ser aperfeiçoada e complementada com novos “insights” (interpretações).
Muitas vezes, na oncologia, mais importante do que exames complementares, o exame físico que segue a anamnese, contribui para a melhor decisão terapêutica. A medicina passa por modas ao longo do tempo, mas o binômio anamnese-exame físico resiste desde o tempo de Hipócrates.
Afinal, anamnese e exame físico são os clássicos da boa prática da medicina!