O Brasil enfrenta um surto de febre amarela silvestre. Oportunidade para recordar aspectos históricos do nosso país. Assim, reproduzo trechos do interessante artigo BRAZIL’S LONG FIGHT AGAINST EPIDEMIC DISEASE, I849-1917, WITH SPECIAL EMPHASIS ON YELLOW FEVER, de autoria de Donald B. Cooper, Professor do Departamento de História da Ohio State University Columbus, Ohio, publicado no Bulletin of the New York Academy of Medicine, em 1975 https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1749529/.
1- Antes da introdução da febre amarela, a costa da América do Sul, desde Pernambuco até o Rio da Prata, era considerada para os europeus uma das mais saudáveis regiões do mundo.
2- Havia uma visão popular no Brasil que o calor intenso equatorial formava uma barreira invisível mas efetiva contra grandes epidemias… até a epidemia de febre amarela em Salvador, Bahia, em 1849-1850.
3- Na verdade, o primeiro surto de febre amarela no Brasil data de 1685-1694, em Pernambuco.
4- O surto foi atribuído ao atracamento em Salvador de um navio que passara por New Orleans e Havana, duas cidades com histórico de febre amarela.
5- Cerca de 3000 óbitos pela febre amarela foram registrados e no prazo de um ano, a doença atingiu Recife, Natal, Belém, Santos e Rio de Janeiro.
6- Muitos recusaram-se a admitir o retorno da febre amarela ao Brasil, que era coisa de estrangeiro intrometido e de “terroristas”. O ministro Visconde de Monte Alegre insistia que era malária. Havia receio em mencionar o nome febre amarela.
7- Desconhecia-se a verdadeira causa, o modo de transmissão, se era ou não contagiosa e o tratamento aplicado era ineficiente e até danoso.
8- A homeopatia ganhou projeção durante a epidemia, na lacuna da ineficácia da alopatia e por razões financeiras. Os alopatas chamavam os homeopatas de charlatães e protestavam com veemência: “… Expulsos e ridicularizados na Europa, estes charlatães vieram para o Brasil como uma paraíso seguro, onde o charlatanismo governa e progride. A homeopatia tem sido adotada por indivíduos sem outro meio de subsistência. Ferreiros, alfaiates e sapateiros estão prescrevendo glóbulos. . Para eles, vita brevis, ars longa de Hipócrates nada significa…“
9- Portugueses e italianos no Rio de Janeiro foram particularmente atingidos pela febre amarela no Rio de Janeiro. Muitos imigrantes morreram algumas semanas após desembarcarem de navio. Chamou a atenção a baixa mortalidade dos negros, sendo que, em 1850, 2/3 da população do Rio de Janeiro eram de negros ou mulatos.
10- Em 1887, Rio News publicou: falando francamente, o império do Brasil não é mais do que uma casa pestilenta de sarampo, febre amarela, beri-beri e várias outras moléstias contagiosas e nem o governo, nem a população tomam medidas preventivas.
11- Em várias ocasiões o governo italiano alertou para que seus cidadãos não emigrassem para o Brasil, o que causou uma redução considerável da imigração ao final do século XIX. O jornal português A Capital alertava os portugueses após 10 anos da epidemia, para não irem para o Brasil. Cidades sem a febre amarela procuraram atrair a imigração: AVISO AOS IMIGRANTES: Parati é perto do Rio de Janeiro e nunca foi atingida pela febre amarela e outras epidemias. Argentina e Uruguai, dois rivais do Brasil em relação à imigração européia, exploraram a epidemia para tirar vantagem.
12- Os custos provocados pela febre amarela eram altos, entre 1889 e 1892, a Academia Nacional de Medicina sugeriu banir a imigração total por vários anos nos portos do Rio de Janeiro e Santos, dois centros endêmicos da febre amarela. O famoso engenheiro negro Andre Rebouças comparou estas duas cidades ao estábulo de Egeu e sugeriu o abandono das mesmas por insalubridade: “… parece de bom senso construir novos portos marítimos com condições de higiene em solo alto e drenado, com água potável, ruas largas, avenidas e praças…”