Evidências reconhecidas por pesquisas randomizadas e por metanálises e transpostas para a beira do leito sustentam o entendimento de utilidade e de eficácia das condutas terapêuticas em geral. Este entendimento consolidou-se nas últimas décadas impulsionado pelo desenvolvimento da Medicina baseada em evidências e da Medicina translacional. Os dois pilares da ética médica, a prudência e o zelo, tornaram-se identificados com a sustentação pela interpretação de dados e fatos resultantes de estudos sistematizados.
Este lado acadêmico da Medicina convive com intervenções, práticas e produtos para o corpo e para a mente que são consideradas alternativos ou complementares. O que se observa é que ambos, o convencional e o não convencional crescem na Medicina ocidental. Decorre uma tendência integrativa, inclusive com disposições para a execução de protocolos de estudos em determinadas áreas da Medicina.
Esta Medicina integrativa associa-se a dilemas éticos por parte do médico. A preocupação maior é com eventuais danos diretos da aplicação de método não devidamente estudado em relação a benefícios e a adversidades e danos indiretos por desequilíbrios pela priorização do alternativo em relação ao convencional.
Em tempos de maior participação do paciente no processo de tomada de decisão sobre suas necessidades de saúde pelo direito à autonomia, a Bioética da Beira do leito não pode desconsiderar três aspectos da questão relativos à prevenção da doença, tratamento da doença e manejo de sintomas da doença e dos causados pelo tratamento (Quadro):
A Bioética da Beira do leito entende que o ponto fundamental é a segurança biológica do paciente, a visão moderna do hipocrático princípio da Não maleficência. A carência de pesquisa dificulta a apreciação da segurança por parte do médico, todavia não permite convicção para desdizer a utilidade pretendida embora não validada cientificamente.
Uma estratégia do médico para a convivência do convencional e o não convencional é incentivar e deixar aberto o diálogo com o paciente. A presença multiprofissional e interdisciplinar de um lado e a sinceridade do paciente do outro possibilitam a avaliação evolutiva de perto da integração da adesão consentida do paciente à recomendação médica estado da arte com a complementação por iniciativa do paciente e informada ao médico.
A peculiaridade a ser refletida com o apoio da Bioética é que a complementaridade não convencional tem alta chance de ser executada independente do posicionamento crítico do médico. Por isso, a recomendação para o médico que após enfatizar as relações de benefício e de segurança, de certa forma e dentro das possibilidades absorva a integração, pois assim poderá analisar de modo mais concreto os acontecimentos evolutivos. Mesmo que se posicione radicalmente contra o uso do método alternativo.
Em outras palavras, o médico, idealmente, não deve ficar indiferente aos desejos e preferência do paciente após verificar que a integração ocorrerá independente dos seus alertas. Para reguardo ético e legal, é essencial que haja uma documentação detalhada em prontuário do paciente a respeito do convencional e do não convencional, não somente ao início do tratamento, mas também por ocasião das reavaliações periódicas.
É possível que médicos hierarquizem uma objeção de consciência e rejeitam acompanhar pacientes que desejem a integração. A Bioética alerta, contudo, que quando o médico envolve-se com o atendimento alternativo inevitável, facilita insistir na aderência ao convencional, atender a realidades evolutivas dos desvios da segurança do não convencional, fortalecer a relação médico-paciente, promover um clima de confiança e, por que não, constituir-se numa fonte de aprendizado em serviço.
A Bioética da Beira do leito enfatiza o valor da individualização caso a caso amparado pelo diálogo e pela documentação que promovem e instruem ajustes que caibam na diversidade da condição humana, no bom-senso da ética e no rigor legal.