São 26 séculos de medicina que contaram com várias Escolas e modos de organização. Na cadeia desenvolvimentista, o século XX destacou-se pelas inovações tecnocientíficas e preocupações com o humanismo. O feedback teoria-prática incorporou a medicina baseada em evidências e a experiência de fato vivenciada ajustou-se ao chamado estado da arte.
Os anos de 1927 e 1971 proporcionaram duas eclosões da organização de pensamentos que passou a lidar com possibilidades do certo e do errado, do bom e do mau ao redor da tecnociência, considerações de deveres e de responsabilidades alinhadas com a filosofia moral e ética aplicada no campo da biomedicina – como nos ensinou Daniel John Callahan (1930-2019)- e que se materializou como Bioética.
A ênfase na beira do leito coopera para a qualidade da assistência à preservação e à recuperação do bem-estar das pessoas, quer nos entendimentos individuais, quer numa referência coletiva. O foco individual remete ao respeito do paciente como pessoa, o reconhecimento da sua capacidade decisória. O foco coletivo lida com oportunidades, com direito à equidade. Ambos devem ser aplicados numa proporção influenciada pelas circunstâncias. Disponibilidade de recursos, prognóstico clínico e restrições éticas e legais compõem o conjunto de significados relevantes.
A medicina contemporânea associa-se a uma cultura da beira do leito que se caracteriza pelo entrelaçamento dos princípios da beneficência, não maleficência e autonomia constantes da Bioética. Nada dispensa este fio condutor entrelaçado nem sempre delicado no tato, mas exigente de ser delicado no trato.
É desafiador para o profissional da saúde, todavia, equilibrar habituais contraposições motivadas pelo compromisso de simultaneamente promover o bem, evitar o mal e atender a anseios individuais. Uma sensação de mover-se em corda bamba. Por isso, a mesma Bioética que motiva a condução por uma corda tensa em elevado nível de responsabilidade precisa representar-se também como rede de segurança.
Cabe ao profissional da saúde a intenção de lapidar constantemente o discernimento profissional para que o esforço de dar clarividência a este trio dominante não provoque distorções sobre o que de fato podem significar em função do estado atual dos conhecimentos científicos e entendimentos da sociedade.
Reducionismos e exageros não são bem-vindos na óptica da Bioética da Beira do leito, mas são sempre tentadores para possibilitar conciliações entre os princípios. Os riscos do niilismo e da coerção alinhados a uma medicina defensiva assustam.