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868- Linguagem e Bioética (Parte 1)

A Bioética da Beira do leito enxerga a beira do leito como um ecossistema, um ambiente plural dentro de limites da tecnociência e do humanismo e que precisa ser protegido. Como toda força gravitacional, a da atmosfera do ecossistema da beira do leito é idealmente atrativa, nunca repulsiva. Uma atração, contudo que pode gerar certos tombos quando não se está com os “pés no chão”.

A idealidade de integração entre bióticos e abióticos no ecossistema da beira do leito pode ser  antevista pelo ângulo da Bioética principialista. Espera-se a mais adequada conjugação dos recursos por  movimentações beneficentes, cautelas não maleficentes, justiça distributiva e liberdade de escolha. A busca pelo melhor possível motiva e entusiasma ao mesmo tempo que causa tensões.

Cada caso clínico influencia e é influenciado pelo ambiente da beira do leito de acordo com as peculiaridades da atenção às necessidades de atenção. O paciente fornece dados e fatos para o médico responsável e este deve conferir ao paciente condições para compreender a medicina aplicável a fim de lhe permitir ter voz ativa na tomada de decisões. As complexidades costumam dominar e exigir atuações multiprofissionais e transdisciplinares.

Disponibilidade às informações pelo médico e acesso às mesmas pelo paciente na beira do leito a respeito das participações bióticas e abióticas nos processos de desenvolvimento do diagnóstico e sobre o potencial  de realização de benefícios e danos nas condutas sustentam o ajuizamento das objetividades de eficiência, eficácia e efetividade mescladas a subjetividades próprias do ser humano. O principialismo da Bioética facilita lidar com a razão e com a emoção vigentes.

A noção de ecossistema da beira do leito tem a vantagem de facilitar a apreciação do direito do paciente à autonomia em meio a injunções de suas circunstâncias. O livre-arbítrio pode colidir com não-liberdades práticas determinadas pela doença. Interdependências intelectuais e morais precisam dialogar com modos de ser ético e legal da beira do leito, o que fica bem aparente em certos conflitos entre beneficência e autonomia.    

Pode-se dizer que o princípio da beneficência inclui a noção da conveniência da aceitação de um método, sustenta a confiança pelo paciente sobre uma heteronomia desde a medicina. O exercício da autonomia, por sua vez, não deve repelir a influência que vem de fora, ela deve representar a capacidade humana para refletir sobre recomendações e decidir com autodeterminação.

Os valores dos princípios da beneficência e da autonomia adquirem condição de ficar de mãos dadas quando as consciências envolvidas integram-se pela linguagem, esta vista como processo de interação e mediação entre partícipes do ecossistema da beira do leito. Em outras palavras, decorre um processo de entendimento linguístico que objetiva a verbalização de um Sim ou Não entre a consciência profissional sobre útil e eficaz (beneficência coletiva) e a consciência leiga do paciente sobre utilidade e eficácia (benefício individualizado).

Aplicar a autonomia não é deixar o paciente sozinho para decidir por si só. O que precisa é contribuir para que ele internalize um exterior o melhor compreendido possível com um sentido de liberdade dentro de uma moldura moral, ética e legal – a autonomia do profissional da saúde não pode ser esquecida.

Como todo encontro, a internalização do que o outro representa tem as possibilidades de expansões e limitações que podem motivar vontades por ajustes. Caso os vaivéns em busca de ajustes provoquem aceitação bilateral, um “final feliz” ocorre após os desajustes iniciais entre beneficência e autonomia. A Bioética esforça-se para aumentar as chances do “enfim um acordo”.

Um cenário da facilitação da reciprocidade de interiorização dos bióticos – fundamentalmente profissional da saúde e paciente- do ecossistema da beira do leito acerca das exteriorizações acerca do abiótico é a mudança de um Não inicial do paciente pelo Sim  proporcionado por segunda opinião.

Frequentemente, há um “quase todo” ajustado entre médico e paciente, apenas alguns detalhes ficam necessitados de revisão, ou seja ocorre um Sim com ressalvas facilmente superáveis. Por vezes, os pormenores não são apresentados nos esclarecimentos para a tomada de decisão e vão provocar alguns transtornos no decorrer da efetiva aplicação do consentido. Por isso, a validade de evitar retirar algumas informações que possam parecer irrelevantes para o médico, mas importantes para o paciente. A experiência coleciona estes vieses de comunicação e motivam o aperfeiçoamento da linguagem que une duas consciências.

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