A relação médico-paciente é sensível à comunicação, à linguagem, vale dizer, não dispensa o diálogo. O médico costuma incomodar-se e reagir quando recebe um Não do paciente, no mínimo porque vê prejudicada a conduta visando ao bem-estar. Por isso, ele lamenta a perda de uma esperança às custas do que poder ter sido um Não mentiroso– o paciente enganando a si próprio. Gera a dúvida se o médico deveria se aprofundar nos esclarecimentos, especialmente quando o Não do paciente é má decisão para um prognóstico nada simples da doença. Qualquer resposta, entretanto, esbarra numa constatação: É difícil avaliar a autenticidade em outra pessoa, vale dizer, é complexo fundamentar o juízo médico que o Não do paciente poderia ser inautêntico.
É vantajoso mentalizar que o processo de tomada de decisão pelo paciente que tenha culminado no Não admitiu uma troca dinâmica de posições de aceitação e de recusa. Cada caso tem seu número e tipo de estratificações para a adesão e para o rechaço que podem ficar mais ou menos transparentes para o médico. Algumas especialidades convivem com peculiaridades do desejo que podem interferir na resposta a uma recomendação médica. Por exemplo, o desejo de manter-se magérrimo traz oscilações à adesão a condutas a respeito da dependência à anorexia nervosa, assim como aspectos estéticos podem induzir a ultrapassar os limites da segurança de um procedimento invasivo. A anestesia tende a ficar bem distante de um Não do paciente, evidenciando que o pensamento sobre sofrimento – natural ou iatrogênico- é fator inegável de autenticidade na tomada de decisão pelo paciente.
Instabilidades entre aceitação e recusa no processo de tomada de decisão pelo paciente são comuns e constituem indicadoras de uma legítima elaboração de máxima autenticidade que culmina no Sim ou no Não do paciente. Como se sabe um (não) consentimento pretensamente definitivo é revogável. Em outras palavras, indecisões expressam autenticidade, eventualmente até mais do que uma decisão que diríamos forçada pelas circunstâncias. Razão para mais esclarecimentos e compartilhamentos de posições práticas.
Outro ponto de interesse da bioética é o Não de um responsável por paciente considerado incapaz para apreciar a recomendação médica. A negativa do substituto designado- legal ou indicado- será tanto mais autêntica quanto mais coerente com valores, desejos, preferências e objetivos de vida do representado, exceto quando uma criança que não teve oportunidade, evidentemente, de ainda se expressar.
Discussões sobre variáveis passíveis de impacto na autenticidade do falar em nome de outra pessoa beneficiam-se pela análise moral/ética/legal/cultural da transição entre incapacidade e capacidade para tomar decisões sobre sua saúde que acontece no chamado adolescente amadurecido. É situação onde podem conviver duas naturezas de autenticidade conflitantes e justificáveis, e que permite identificar uma série de itens de apreciação da autenticidade em outra pessoa.