A Bioética de todos nós encorpa-se no nosso interior pelo sequente ganho de experiência profissional desde a formatura até a aposentadoria e assim motiva dois símbolos: a letra T e uma flecha disparada. A letra T compõe a abrangência de conhecimentos e habilidades na barra horizontal e a profundidade do saber na barra vertical numa expansão atenta à devida proporção estética. A flecha disparada representa o compromisso com a vivência do passado como orientadora do futuro e tem o pensamento crítico como tensionador do arco.
Ponto zero costumeiro da autocooperação da Bioética de todos nós é o Rigor tecnocientífico (fundamento 1). Médico e profissionais de saúde de modo geral atuam na beira do leito contemporânea segundo evidências organizadas e opiniões especializadas validadas e atualizadas e objetivando a melhor integração entre diagnóstico, terapêutica e prevenção. Todavia, o rigor com o estado da arte vigente não esgota o manejo das infinitas heterogeneidades do mundo real. Acasos superam os casos de livro e o Rigor tecnocientífico não abrange muito que não se conhece, que não pode ser previsto e que não pode ser evitado. Assim, estar em rigorosa sintonia com a excelência tecnocientífica atualizada não isenta as recomendações dadas ao paciente de indeterminações. Por mais que predisposta a reproduzir o conhecimento tecnocientífico que inclusive gerou em pesquisas clínicas, por exemplo, a biologia humana não se propõe a uma obediente disposição recíproca.
As fronteiras entre o potencial e a realização na beira do leito de todos os dias não estão sempre escancaradas e receptivas, elas estão cheias de controvérsias, sujeitas a percepções limitadas e, muitas vezes, fora do alcance da compreensão. A transposição ocorre após a aplicação do método de maneira mais ou menos desejada. Por isso, a exigência da Abertura (fundamento 2) da mente profissional ao desconhecido/imprevisível/inevitável.
De modo similar, o rigor com a atualidade da ciência não representa consenso de pensamento, ou seja, verdades do conhecimento admitem atribuições distintas de valores. É uma fronteira livre e necessitada da Tolerância (fundamento 3), vale dizer, o respeito a opiniões contrárias de colegas, gestores, pacientes, familiares, a virtude que se incorporou à transdisciplinaridade e que coopera para inibir dobraduras indutoras de complexidade/conflito.
A Tolerância só se aplica em questões de opinião e quando se passa a sensação que teríamos o direito de impedir a manifestação oposta. Contudo, Tolerância não significa passividade e por isso, o aspecto crítico que tolerância universal é inviável, especialmente, quando está em jogo a sobrevivência, a liberdade e a honra. Desta maneira, o profissional da saúde deve entender que o exercício da Tolerância é um momento às vezes provisório, às vezes definitivo, que tem um potencial de redirecionamentos pelo crédito à possibilidade de o paciente manifestar-se com mais conhecimento de causa sobre a interdependência entre a verdade do médico (que é do conhecimento) e o valor (que é do desejo) atribuído pelo paciente. Um corolário da Tolerância de alta significância na beira do leito e todos nós é prover a oportunidade para o profissional da saúde reconhecer em contraposições do paciente a necessidade de dedicar tempo para re-explicações.
Rigor tecnocientífico, Abertura e Tolerância formam um primeiro conjunto-guia da Bioética de todos nós com inspiração na visão transdisciplinar. A adoção entrelaçada proporciona oportunidades para o diálogo entre consistências das precisões, dúvidas das imprecisões e inconveniências do dogmatismo e, assim, dá sua contribuição para a Bioética de todos nós distanciar a beira do leito de todos nós de uma torre de Babel.