A atenção às ressalvas sobre morte iminente presentes no Código de Ética Médica vigente precisa não somente do olhar clínico – pois, nem sempre está clara a situação da iminência na evolução de um atendimento-, como também da consideração ética e legal sobre aspectos contemporâneos da medicina, como terminalidade da vida, cuidados paliativos, ortotanásia, obstinação terapêutica, contraindicações e diretivas antecipadas de vontade.
Desta maneira, faz-se necessária a adjetivação do termo morte quanto à reversibilidade, à possibilidade de continuidade da vida com qualidade segundo óptica alinhada com o direito ao princípio da autonomia pelo paciente. No Art. 31, por exemplo, o salvo deve considerar diferenças entre morte evitável – ressuscitar uma parada cardíaca- e morte na fase avançada de uma doença irreversível.
Tive uma experiência emblemática sobre a dificuldade de se estabelecer uma linha de corte sobre iminência de morte. Alguns presos decidiram fazer greve de fome, foram internados no hospital e membros do Comitê de Bioética ficaram em plantão para a situação. Em determinado momento, os níveis de potassemia baixaram a níveis preocupantes, uma disritmia cardíaca grave poderia acontecer, como a fibrilação ventricular. Houve ampla discussão e após vaivéns bem sustentados, a decisão foi a de utilizar a ressalva ética do risco de morte iminente. Foi ocasião magnífica para reforçar o imperativo que membros de um Comitê de Bioética são imparciais e devem evitar manifestar juízos morais sobre o paciente, apesar de não necessariamente serem neutros nas contraposições em análise.
A cooperação de um Comitê de Bioética para a interpretação do código de ética é essencial na prática contemporânea da medicina. Exige a transdisciplinaridade. O diálogo entre distintos saberes, incluindo, a arte, a literatura e a espiritualidade, amplia os ângulos de visão sobre as questões e permite que cada membro ensine e aprenda com os outros. A letra T simboliza o valor, a barra horizontal representa abrangência que se desenvolve e vertical o acréscimo de profundidade.
O profissional da saúde em contato com advogados, por exemplo, fica mais consciente sobre os Direitos e Garantias Fundamentais da nossa Constituição (1988) de interesse mais direto na beira do leito, entende que o Art. 5o vai além de Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida. Aprende que ele é composto por 78 termos, incluindo VI– é inviolável a liberdade de consciência e de crença, X–são invioláveis a intimidade, a vida privada, XII–é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (leia-se atualizando os meios).
Desta maneira pode-se entender que o Sigilo profissional do médico há muito respeita os itens X e XII e que inviolabilidade do direito à vida e liberdade de consciência e de crença guardam equivalência em reflexões sobre conflitos acerca do direito ao princípio da autonomia.