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608- A lei de Putt, o anverso e o reverso (Parte 1)

A tecnologia modificou a dinâmica de atuação profissional na beira do leito. Como diferencial e como obrigação tem motivado o desenvolvimento de novas competências por profissionais da saúde. Uma decorrência é a necessidade de aprendizados sequentes e o descarte de uns tantos que um dia foram considerados imprescindíveis e agora resultam desvalorizados pelo determinismo tecnológico.

O termo tecnologia ganhou um sentido de método exterior ao ser humano capaz de provocar alguma transformação, entretanto, não devemos esquecer que significa técnica e, portanto, admite o conjunto de habilidades naturais fundamentadas nos órgãos do sentidos que tradicionalmente são empregadas  pelo médico – inspeção, percussão, palpação e ausculta. A mão do médico é tecnológica quando palpa, quando segura um transdutor, quando introduz um cateter, quando envia uma mensagem de texto, quando corta e sutura ou quando transmite a presença solidária.

Todos os dias temos encontros e reencontros com necessidades do paciente. Todos os dias as necessidades exigem seleção de técnicas validadas. Todos os dias as escolhas qualificam o profissionalismo.

Todos os dias, portanto, o profissionalismo nos desafia. É presença forte. Guia nossos comportamentos. A primeira noção que dele tive foi ainda estudante quando  o  catedrático de clínica médica afirmou que desenvolveríamos um constante diálogo entre convicções e dúvidas perante o paciente, que ao mesmo tempo em que deveríamos nos comprometer por inteiro com uma conduta, teríamos que ter a consciência de podermos estar errados. Mais de meio século depois, persiste verdade ampliada pela enorme expansão dos métodos cada qual com suas atribuições positivas e potencialidades negativas.

O profissionalismo é, pois, um compromisso de coragem moral (valor na dignidade), social (valor no relacionamento) e criativa (valor na qualificação de mudanças) que abraçamos um dia e valorizamos desde então na beira do leito. Uma decorrência espinhosa é que nos obriga periodicamente a conscientizar nossas incompetências novas ou recorrentes. É justificável e desejável. Cada caso por mais corriqueiro é frequentemente um conjunto novo sobre velhos diagnósticos, onde certas necessidades do paciente sob nossa responsabilidade não cabem nas nossas mãos. Nossa própria mente é que deve vigiar os limites. Especialmente quando  o senso de rapidez em prol da beneficência faz manejar uma metamorfose de aplicação de método seguindo a experiência de outros.

Exageros à parte, a graduação é, tão somente, o meio para ter o direito de cursar a Residência Médica, onde, de fato, um formado se reforma e ganha a segurança necessária para se envolver com o profissionalismo. Acontece que à medida que nos propomos a desenvolver competências na pós-graduação sensu lato, nos afastamos de fontes de demais conhecimentos e de habilidades conhecidas existirem na graduação. Organizando profundidades, dispensamos abrangências no vasto acervo da medicina. Neste contexto, Pablo Ruiz Picasso (1881-1973) disse que todo ato de criação é antes de tudo um ato de destruição. Razão para o grau de ansiedade que se observa por lidar com novas bases no desenvolvimento das competências, que contribui para o compromisso pessoal desembocar na satisfação profissional.

 À medida que nosso número do CRM cai no ordenamento dos médicos, os ponteiros do relógio profissional parecem mais céleres e nos exige mais esforço para nos preservar atualizados sobre nosso campo de atuação. É essencial manter um fio condutor para a máxima harmonia nas escolhas alinhada com a consciência moral, vale dizer a responsabilidade individual. Por isso é que a Bioética da Beira do leito entende que o pacto com a competência exige não somente possuir, mas também sentir e respeitar. Por exemplo, não parece elogiável a consulta a uma diretriz clínica para aplicar a um paciente a fim de suprir certas incompetências em outra especialidade que são fruto da relação inversa entre o mergulho na profundidade da sua especialidade e o afastamento da abrangência pelas demais.

No caminho de recém-formado (após seis anos de faculdade) para recém-informado (quase todos os dias), novidades e inovações sucessivas nos fazem conviver com o paradoxo do especialista contemporâneo, ser competente para isso e estar incompetente para aquilo. É a absorção na rotina do aquilo que dará clareza às complexidades impostas e ajudará a serem bem-vindas ao conjunto do isso. Inclui-se na coleção-alicerce do desempenho  profissional que merece ser adjetivado como ético.

Preservar-se competente significa o médico poder dispor dos métodos e das ferramentas adequadas no tempo e no espaço. Ocorre que proporção expressiva dos atendimentos na saúde representa um estado de caos no corpo do paciente cada vez mais exigente de soluções com ferramentas evoluídas.  É notável como uma ficção de poucas décadas atrás  torna-se uma realidade bem sistematizada, como o transplante de órgãos.  Corre-se atrás, alcança-se e parte-se em frente por novo desafio da formatura à aposentadoria.

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