LUIS HENRIQUE FURQUIM DE CAMPOS
Esta história começou há 40 anos quando implantei uma prótese valvular aórtica. Hoje convivo com a quarta prótese valvular. Afirmo que sempre tive ótima qualidade de vida entre as operações.
Nunca encarei a questão pelo lado de ‘trocar uma doença por outra’; sempre ficou claro que eu era partícipe do processo de decisão e que seria melhor o que me desse um dia-a-dia o mais próximo possível do normal – trabalhar, ter e criar filhos, sustentar a família, poder fazer exercícios, ter vida sexual ativa,poder viajar, etc., etc., etc…; de certa forma o processo de ‘escolha’ nas quatro cirurgias que fiz foi dentro deste padrão de expectativa; entender o problema, obter as informações necessárias com o médico e, junto com ele, tomar a decisão melhor para minha qualidade de vida.
Da primeira vez, o peso das informações dos médicos foi muito forte, eu era jovem, com desconhecimento das variáveis, e fiz a cirurgia da valva aórtica sem muitas escolhas (ou talvez não me tenham sido expostas, à época, as alternativas de próteses); era mais ou menos me cingir à escolha entre os riscos da cirurgia versus os riscos da não cirurgia. Mas nas outras três vezes, para a retroca, as questões da vida mais próxima possível da normalidade foram decisivas e, confesso, teve pouco a ver com a necessidade ou não de anticoagulação.
Na segunda operação, por que tinha tido a experiência da ‘vida normal’ no período de uso da prótese de dura-máter, e, na terceira, quase que implorei, para receber uma prótese parecida com a anterior, por estar convencido que a prótese que usava era ‘melhor’ para este estágio a que me refiro de ‘normalidade’.
Nunca cogitei de implantar uma prótese mecânica e não foi em função dos aspectos da anticoagulação; as decisões estiveram ligadas à experiência positiva anterior, àquilo que vivenciei, experiência que acreditava positiva e tipo de vida que levava. Já na última, aceitei muito bem as recomendações sobre a conveniência da prótese mecânica, pois me convenci, à luz das informações passadas, que tinha um coração já muito mexido e que o meu tórax não era um zíper, que poderia ser aberto ou fechado quando quisesse.
Em outras palavras, nesta quarta operação pesou, e muito, a possibilidade de operar outra vez, sabe-se lá quando e em que estado, em contraponto a enfrentar a questão de TPs e uso de varfarina.
Portanto, não se trata de que a prótese tal é melhor do que a outra, circunstâncias e valores pessoais valem muito, sobre as quais o médico pode, no máximo, alertar, orientar e dar opções. Acredito que as opções-decisões foram as mais adequadas por se enquadrarem na minha perspectiva de vida, naqueles momentos em que a vivenciava. Tem tudo a ver com a questão científica e os aspectos humanos e por isso a interação médico-paciente é crucial.