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490- Conhecer-ser-fazer

 A beira do leito representa um ecossistema cujo equilíbrio depende da interação entre fundamentos da ética como prudência e zelo, princípios da Bioética como beneficência, não maleficência e autonomia e visão e atitude transdisciplinares pela integração entre rigor tecnocientífico, abertura e tolerância. Segundo Aristóteles (384 ac-322 ac), é fazendo que se aprende a fazer aquilo que se deve aprender a fazer, e, por isso, o profissional da saúde que tenha a intenção de participar da beira do leito necessita estar inserido ativamente neste ecossistema, exigência categórica para o fortalecimento da tríade conhecer-ser-fazer.  

Conhecer a si mesmo e conhecer circunstantes e ambientes com isenção de segredos é primordial para o desenvolvimento da consciência profissional e, assim, o ser profissional vir a ganhar discernimento para o momento em que é preciso fazer a aplicação do método e para o momento em que não deve fazer o mesmo, escolhas de um cotidiano cada vez mais frequente. Aliás, são justamente as limitações às espontaneidades do fazer conceitualmente admissível, como as ligadas a direitos de outrem, normas éticas, morais e legais, que constituem fios condutores da percepção do dever de respeitar opiniões de pacientes em contraposição a reais possibilidades de benefícios tecnocientíficos. A conexão profissional da saúde-paciente na beira do leito convive com pensamentos expressando distintas representações e conceitos, emoções interligadas e movimentos instintivos ou energizados pela memória por parte do paciente que se encaixam na concepção de Blaise Pascal (1623-1662) que o coração tem razões que a própria razão desconhece.

Conhecer-se e ao ecossistema em geral requer do profissional da saúde a consciência do exercício de um trabalho com determinação, continuado, intenso, onde a disposição pessoal para a vivência que gera confiança profissional é essencial. Não há dúvida que o conhecimento não chega espontaneamente e que a sua conquista não dispensa a ajuda dos demais elementos do ecossistema, cada qual com sua sabedoria produzindo evidências a serem extraídas e necessitadas de ajustes caso a caso.

O profissional da saúde assim como precisa estar integrado a sua classe atualizada de atividades, sempre renovando impressões sobre o estado da arte, esforçando-se em as conectar com a memória acumulada, também deve estar ciente que cada geração não é uma reunião de “eus profissionais” perfeitamente idênticos, até porque cada “eu” – como o próprio- nunca é invariável nas 24 horas do dia. De fato, cada um deve ter em alta conta o profissional que deseja ser, o que deseja agregar, o que pensa que deve ser nas variadas circunstâncias, uma pluralidade  de comportamentos na imensidão do ecossistema em que atua plena de estímulos diversificados para motivar suas ideias, vontades e emoções, ao sabor dos impactos, muitos dos quais sem possibilidade de se exercer controle sobre os mesmos, inclusive com a possibilidade de desencadear eventuais “acidentes” anti-éticos e ilegais de atitude, transgressões passíveis de termos que vivenciar  o desprazer de responder constrangidos por uma violência praticada. Treinos em atitudes são úteis como prevenção, uma antecipação ao erro, este fantasma da profissão que, como sabemos, serve de fundamentação pedagógica para evitar repetições.

Dever, honra, consciência não devem estar algemados a um eventual “efeito manada” do qual se discorda com argumentos perfeitamente admissíveis. Razão da Bioética da Beira do leito estimular a construção da experiência profissional pela tríade conhecer-ser-fazer, a sucessão natural de transformações pessoais e profissionais no sentido da seriedade desde a admissão num ambiente de formação universitária, numa plataforma de integração de ética, bioética e transdisciplinaridade.

É desejável mergulhar fundo no autoconhecimento para poder reconhecer corretamente os 90% do iceberg da própria essência e saber adquirido submersos pelo peso de influências até mesmo desprovidas de maior valor e que, majoritários, dão real sustentação àquilo que podemos entender como o bastante qualificado para influenciar tomadas de decisão. De fato, os 10% aparentes do total podem ser pouco para a instrução e compreensão da maioria dos temas que afetam a beira do leito ética.

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