Temos realizado algumas incursões conceituais sobre a aplicação da virtude da tolerância no processo de (não) consentimento, mais especificamente a situação de negativa do paciente ao médico para aplicar uma conduta recomendável, em respeito ao princípio da autonomia.
Considerando a necessária simbiose entre médico e paciente para o usufruto da Medicina, uma recusa do paciente a aceitar um procedimento que o médico avalia que está eticamente obrigado a expor e praticar tem o potencial de provocar reações profissionais distintas.
Uma delas a destacar e que é habitualmente observada no jovem médico que ainda não está devidamente treinado para não executar o cientificamente validado e recomendado na circunstância é a manifestação de certa agitação mental pela preocupação com a perda pelo paciente da oportunidade do benefício e consequências sobre o prognóstico. Além do claro interesse pela saúde do paciente, ela pode incluir uma inquietude com a própria imagem profissional, e, na suposição de futura acusação de negligência, ele se apressa em se auto-acusar pela não aplicação, como se os danos da sua inércia pela negativa do paciente significasse uma conceituação de culpa sua. É atitude que se encaixa em concepções de narcisismo – auto-admiração, supervalorização do saber, restrição à compreensão das realidades de outrem- e de hipocondria moral- sentimentos de culpa por pensamentos de mau profissionalismo.
Uma das missões da Bioética da Beira do leito é justamente provocar no médico reflexões sobre os limites de sua responsabilidade quando ele fica impedido de se expandir na plenitude da sua competência pelo não consentimento pelo paciente e precisa, então tolerar uma posição não beneficente, refrear o seu poder de fazer benefícios, superar a sensação que está sendo imprudente e negligente perante um mal que poderia reverter. Estimular o médico a propor-se à insistência da recomendação segundo o paternalismo fraco é sempre desejável nesta situação e não conflita com o respeito ao direito à autonomia do paciente.