Todos os médicos cuidam da Saúde por ofício, mas, na verdade, a Medicina que abraçam não faz com que estudem a saúde em si, abstrata, como uma forma do bem. Estudam-se desde a primeira lição na Faculdade de Medicina saberes da ciência que visem a resultar num bem para a saúde do homem ou para a saúde de determinado paciente. Cada um administra o seu conceito muito próprio do significado de saúde. São variações sobre a noção bem estabelecida que saúde não é ausência de doença e que vincula-se à capacidade individual de ajustes ao ecossistema em que se vive (qualidade de vida), especialmente nos tempos atuais de maior expectativa de vida, vale dizer perante mais chance para aparecimento de morbidades e maior tempo para a evolução das deficiências de órgãos e sistemas.
O saber técnico-científico que cabe aos médicos aprender e aplicar é tanto quanto possível sustentado pelas evidências clássicas e renovadas conforme visão universal. Ele é um entendimento circunscrito da saúde sob salvaguardas éticas e legais que subentende alta racionalidade. Manifesta-se por um comportamento racional comprometido com verdades da época, renováveis e revogáveis, organizadas e validadas sem nenhuma conotação de definitivas, não certezas para serem aplicadas de modo ético e legal. Aprende-se que verdades amparadas por evidências coletivas e vivências individuais não exigem certificados de absoluta certeza para produzir os bons resultados pretendidos, embora sujeitas a adversidades previsíveis e imprevisíveis em função da natureza biológica dos efeitos.
A necessária confiança do médico no saber beneficente atualizado pode gerar no paciente/família uma ideia de excesso de racionalidade. De fato, persuadido pela dimensão de efeito útil e eficaz associada à alta probabilidade de certeza, o médico pode prejudicar a empatia da maneira como Aristóteles (384ac-322ac) alertou: “… a arrogância que existe no excesso de racionalidade…”.
Desta maneira, é essencial que o médico comunique-se com o paciente com palavras que evitem que o saber que domina e recomenda porque vislumbra útil, eficaz e provável de acontecer soe para o paciente como prepotência ou até desprezo. A vulnerabilidade exacerbada do paciente predispõe a interpretações de superioridade que, embora não correspondam a intenções do médico, são favorecidas pelo centralismo científico.