O consentimento do paciente a uma recomendação do médico admite uma pluralidade de circunstâncias. O imprescindível alinhamento transcende um sim ou não que regula movimentos diagnósticos, terapêuticos ou preventivos na beira do leito. Trata-se de um processo de acompanhamento do raciocínio do médico onde o paciente tem o direito de exercer o diálogo – perguntar e receber resposta, ser perguntado e emitir resposta.
No sentido paciente- médico, a vulnerabilidade do paciente acentuada pela doença e modulada pelos impactos de sintomas, restrição da qualidade de vida e perspectivas prognósticas e sua carência de conhecimentos especializados da Medicina são fatores envolvidos na habitual dificuldade de acontecer uma conversa de fato comunicativa e rica em esclarecimentos sobre suas reais pretensões.
No sentido médico-paciente, a construção do profissionalismo privilegia o conhecimento baseado nos estudos em larga escala da doença a ser cuidada e tende a colocar em segundo plano aspectos pessoais não clínicos daquele paciente.
A ausência do diálogo por uma certa habitualidade de mudez com surdez no contexto da relação médico-paciente cria frequentemente uma sucessão de providências sustentada por uma permissão do paciente – postura passiva- alicerçada na razão científica, na representação mental de um meio considerado útil e eficaz, contudo carente de um real consentimento- participação ativa no processo de tomada de decisão.
Tudo se passa como uma entrega do paciente pela confiança no médico e nos seus métodos, o desejo do paciente perfeitamente superposto ao do médico. Sabe-se, no entanto, que esta superposição pode estar longe de ser autêntica, no íntimo o paciente gostaria de ser conduzido de modo distinto, poderia ser, não se trata de uma fantasia, a sua predileção teria validade no contexto da Medicina. Ele, todavia, se cala, mordaças culturais existem e persistem graças a restrições de tempo de conexão efetiva médico-paciente e, porque não, a deficiências na formação do médico a respeito do equilíbrio da técnico-ciência com o humanismo.
A Bioética da Beira do leito sabe que tais comportamentos de submissão do paciente com contenções de palavras para expressar sua opinião é etiopatogenia de conflitos na evolução do atendimento. Eles assim acontecem mais comumente na má evolução que libera a retenção do não dito e provoca uma manifestação ampliada e energizada pela repressão em meio à frustração com a expectativa da condução aplicada e agora gritada como autoritária – esta mola que se distende tem tanta força emocional que faz, inclusive, muitos pacientes reagirem com distorções como acusações descabidas de erro profissional.
A Bioética da Beira do leito entende que a cautela com o desenvolvimento de um processo acolhedor de consentimento, vale dizer, a boa qualidade do passo-a-passo decidido perfeitamente apoiado num consensual manifesto é método imunizador- no grau que pode haver em se tratando de condição humana- contra explosões de sentimentos por ocasião de evoluções clínicas frustrantes.
Cenários de expansões incontroladas de insatisfações causadas por liberação de aprisionamentos de desejos, preferências, valores e objetivos devem, portanto, ser entendidos como um dos efeitos adversos da falta de diálogo ao longo das várias fases doe um atendimento médico.