Momento é ocasião definida num tempo. Crise é um momento de tensão. Apreciações sobre crises da beira do leito sob óptica da Bioética precisam ser sensíveis aos momentos em que se fazem escolhas, afirmam-se decisões e aguardam-se as realizações de expectativas.
Doenças têm momentos de (não) manifestação na sua história natural. Aspectos individuais determinam variantes quer no grau de comprometimento de um órgão/sistema, quer na intensidade de sinais e de sintomas, quer na evolução clínica espontânea ou sob tratamento. Ademais, a condição humana reage a enfermidades numa sucessão de momentos racionais e emocionais que nem sempre costumam ser perfeitamente inteligíveis por circunstantes.
Isto tudo resume-se a: normatizações sobre fazer ou não fazer num determinado momento admitem heterogeneidades de conduta em função de personalizações da história natural- há diabéticos distintos embora todos com diabetes- e/ou da história modificada por intervenções- hábitos, farmacologia, procedimentos invasivos.
Enquanto a Medicina personalizada não chega com o seu vigor à beira do leito, condutas éticas são praticadas sob uma concepção de benefício global para o diagnóstico e ajuste pela análise de segurança individualizada. Assim, faz-se desde o watchful waiting até intervenções de grande porte, idealmente fundamentadas por evidências científicas. Estas sustentam validações que acontecem e mantém-se sob a moderna óptica da estatística que referenda maioria de sucesso. Quanto à minoria complementar, ela é entendida como parte dos percalços do lidar com biologia, desde que não haja indícios de má prática.
E aí vem uma consideração: o mal sucedido pode admitir uma conduta que não deveria ter sido praticada naquele paciente, mas que costuma ser praticada nos pacientes de modo geral em função de maioria de sucesso. Uma situação de “não era o momento” que simula a pesquisa que havia evidenciado que nem todos são beneficiados por uma intervenção em mesmos momentos. Eventual não fazer tem o potencial de interpretação de negligência e, nem sempre, há critérios de prudência para a não realização.
Acresce que a chamada fase de mercado que é quando a inovação atinge vários subgrupos não exatamente estudados ou até excluídos pela concepção do estudo vai com o tempo revelando um mundo real com muitas frustrações e interrogações, motivando mais pesquisas, mais evidências em contraposição a anteriores, etc… etc… Todas as especialidades- umas mais, outras menos- exibem este carrossel de condutas. Não existe mais o período de tempo que permitia o aguardo de uma nova edição de um Livro de Medicina.
Uma constante atualização da literatura conjugada com o acúmulo da própria vivência -sempre crítica- dos casos faz o médico ético conduzir-se pela individualização como método para melhor atenção aos interesses daquele paciente, contudo, para tal, deve ser prudente sem descambar para o defensivo. Especialmente, quando ele entende que a conduta tende para não fazer um procedimento considerado anatomicamente corretivo e fazer, por exemplo, uma estratégia de apoio à função, como não colocar um stent numa angina estável e focar na farmacologia. Pressões leigas e da academia não faltam – exigentes de sólida fundamentação clínica para contenção-, inclusive porque a sociedade costuma sofrer mais impacto de “aprendizado” com informações na mídia sobre celebridades submetidas a procedimentos invasivos. Não é notícia que um artista famoso irá tomar três medicamentos para reduzir a chance de um infarto do miocárdio como é aquela que informa ter sido submetido a uma intervenção anatômica no seu corpo.
Medicina ética porque prudente -para o paciente- versus Medicina intensa porque defensiva -para o médico- é um dos temas relevantes da Bioética da Beira do leito. Ele poderia absorver um título de Bioética do momento com objetivo de estimular apreciações sobre influências e impactos das incertezas do momento de hoje sobre os momentos futuros, interessar-se em desenvolver métricas para medir realidades autênticas do momento clínico, causar reflexões sobre antevisões de decorrentes possibilidades de crises na continuidade da relação médico-paciente.
É cristalino que cada médico precisa consolidar sua posição de consciência sobre a suficiência da prática da prudência – sensibilidade e fidelidade ao futuro- que lhe permite objeções a efeitos de manada, comportamento sintetizado como um momento de liberdade ética para um esplêndido isolamento.