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236- Copy-paste ou lápis-borracha?

A indagação é recorrente na beira do leito: o quanto de ajustes a medidas diagnósticas e/ou terapêuticas aplicáveis é necessário que o médico faça para proporcionar ao paciente o mais harmônico cumprimento da inter-relação benefício-segurança- direito à autonomia.

O médico lida comumente no processo de decisão com sensações variadas acerca do conhecimento que possui. Elas incluem uma gangorra  de certezas e de dúvidas, um temor de haver desconhecimentos, de estar faltando alguma coisa, hesitações sobre a intensidade de raciocínio exigida, surpresas  pela revisão da literatura atualizada, curiosidade acerca de opinião de colegas, coragem perceptiva para intuir que é necessário algo a mais, inclusive, fora do script convencional.

A beira do leito ensina que o compromisso do médico com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional não é antagônico à dúvida. É respeito pela verdade. Neste contexto, é interessante ressaltar que a verdade da evolução de um caso pode ou não ser a verdade evolutiva do próximo caso análogo, um “gêmeo”, é verdade, mas dificilmente idêntico. E, também porque não faltam casos “fora de série” em função das infinitas combinações de morbidades, manifestações distintas de mesmo CID, multiplicidade de opções técnico-científicas validadas e individualidades de caráter, personalidade e temperamento atuantes na relação médico-paciente. Eles merecem uma atenção especial da Bioética porque podem ser rotulados como enigmas e dilemas associados que são a dificuldades e ambiguidades de interpretação e deliberação.

Há inevitáveis equívocos do médico e  provocações de riscos e  acontecimentos danosos ao paciente no cotidiano do profissionalismo praticado na beira do leito. Minimizá-los é meta que só pode ser atingida quando, passando pelas experiências, não se procura encobrir os fatos. É essencial analisar qualquer desconformidade entre o previsto e o realizado. Assim como a conformidade não significa que a reprodução da conduta garanta uma seguinte superposição, em função das inter-relações acima apresentadas.

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Crédito: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4030148/pdf/fnhum-08-00320.pdf

 

O silêncio sobre as certezas observadas na evolução clínica, especialmente se distintas das verdades previstas, é um dano para a eficiência na beira do leito. A observação judiciosa das consequências dos métodos recomendados e utilizados é lição inserida no contexto aristotélico que o que é necessário fazer para aprender é fazendo que se aprende. E reaprender e aperfeiçoar.

Não deve existir médico sem lápis e borracha. É desejável que o paciente seja esclarecido esta realidade por ocasião do consentimento. Há responsabilidade com o controle do momento, incluindo aquele decorrente do binômio intenção-ação, que presume-se, corretamente qualificado pela técnico-ciência e pelo humanismo.

O feedback orientador para redesenho de conduta admite impactos subjetivos e objetivos, tanto do médico quanto pelo paciente.  Nem sempre é fácil ser crítico de si mesmo  para  perceber  falhas que se mostraram, felizmente, inconsequentes, quando “tudo deu certo”. A comunicação médico-paciente beneficia-se muito do efeito lápis-borracha. Quantas atuações técnico- científicas impecáveis não são depreciadas pelo entendimento de carência de emissão de palavras aguardadas pelo paciente.

Assim sendo, o médico  trabalha com contingências estatísticas. Elas valem-se de uma plataforma da literatura que dá uma medida da eficácia, mas que deve ser ajustada no aspecto técnico-científico e ampliada ao caráter humano da Medicina, lápis-borracha a cada feedback entre atendimento  intencionado  e aplicado e garus de superposição entre evolução a posteriori de fato percebida e a priori presumida.

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