O grau de adesão do paciente a planos de tratamento e/ou prevenção médicos é variável caso a caso, uma coisa é consentir sobre uma conduta, pretender aderir e outra coisa é segui-la conforme idealizado. Lembrando Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) tem uma pedra no meio do caminho/no meio do caminho tem uma pedra. De fato, não faltam pedras na observância de recomendações médicas quando o efetor passa a ser o paciente longe do médico, tendo a própria consciência como cuidadora de si.
Motivações para a adesão pelo paciente admitem sustentações profissionais e se enquadram na missão paternalista branda do médico que procura encontrar modos de ajudar o paciente a iniciar e a persistir, fazer ajustes ao longo do tempo conforme individualidades, bem como entender motivos de falhas, sem nenhuma atitude coercitiva. Por outras palavras, esforços para que decisões autonômicas do paciente estejam em conformidade com a representatividade heteronômica do médico.
É essencial respeitar o direito do paciente ao princípio da autonomia no ecossistema da beira do leito, vale dizer, desenvolver, sempre que possível, um clima de compartilhamento produtivo no âmbito da conexão médico-paciente. O médico contribuir para a adesão do paciente pode ser um processo trabalhoso, mas também gratificante na medida em que valoriza a experiência profissional e não dispensa criatividades.
Faz parte da competência profissional maneiras de propiciar benefícios para a continuidade do planejamento consentido mesmo à distância quando o paciente pode se comportar de várias maneiras. A qualidade dos esclarecimentos sobre beneficência e maleficência, sobre prognóstico, sobre qualidade de vida, sobre suportes evolutivos é riqueza do componente comunicação para a excelência profissional na conexão médico-paciente. Contribui para uma imaginada companhia solidária do médico de reforço da adesão.
Fatores econômicos, sociológicos, educacionais, culturais, cognitivos incidem sobre o paciente como obstáculos na continuidade adesiva qualificada. A prática cotidiana é plena de casos de pacientes que pecam na adesão por carência de recursos financeiros, esquecimento, desilusão com baixos efeitos beneficentes ou insatisfação com a qualidade de vida provocada. Insista não desista é lema vantajoso, mas necessita de vigilância, manutenção do foco solidário. A disponibilidade pelo médico de tempo qualitativo é fundamental, algo que nem sempre acontece.
Aspecto ético relevante é que as desmotivações do paciente que acontecem mais perto ou mais longe do contato com seu médico associam-se a consequências passíveis de se articularem com mau prognóstico sobre qualidade de vida e sobrevida no presente, em futuro próximo e/ou em futuro longínquo.
Conhecimento da medicina pelo médico, conhecimento de si (preferências, valores, objetivos) pelo paciente, beneficência/maleficência dos métodos interagem e influenciam o nível de adesão, o que significa a imperiosidade do diálogo recorrente médico-paciente-medicina. A continuidade revela situações em que liberdades teóricas resultam impactadas por não liberdades práticas – o caso da dor e do sofrimento físico que impede o paciente de materializar a preferência por uma conduta conservadora.
A coleção de casos exerce efeito dinâmico sobre a comunicação do médico ao paciente num ato prescritivo. Cada profissional constrói um modo de esclarecer sobre adversidades de acordo com suas experiências considerando que a leitura da bula, por exemplo, tem o potencial de exercer desistências de uso. A facilidade da comunicação do paciente com o médico é capital para ajustar a prescrição perante eventuais adversidades, assim evitando um suspensão total.
O nível de adesão do paciente está intimamente alinhado a resultantes da composição entre intromissão pelo médico na privacidade mental do paciente e liberdade cognitiva do paciente para manifestar voz ativa, consentir ou não consentir, persistir ou desistir.
A confiança mútua direciona para o diálogo produtivo que produz feedbacks ajustadores. Obstáculo contemporâneo é a redução das conexões médico-paciente ininterruptas, o que permitia os termos cliente e médico de confiança. Conexões mais voláteis, mais líquidas – não se solidificam – tendem a comprometer o “uso contínuo”.