Numa tentativa de suicídio, por exemplo, a vontade de momento do paciente de morrer não é levada em consideração, providências médicas em emergência pelos efeitos são efetuadas e há relatos de agradecimentos de pacientes pela atenção médica recebida uma vez restabelecido e livre do quadro depressivo causal.
A orientação para atuar prontamente é uma interpretação da exceção presente no Art. 22 do Código de Ética Médica: É vedado ao médico deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte. Numa redação mais direta, é permitido ao médico deixar de obter consentimento do paciente para aplicar métodos da medicina quando houver situação de iminente risco de morte. O tempo é precioso para a possibilidade de sobrevivência e, muitas vezes, inclusive, os esclarecimentos médicos que sustentam o consentimento ficam prejudicados pela má condição cognitiva do paciente na gravidade clínica.
Alguns artigos depois, o Art. 31 reforça que É vedado ao médico desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. Numa redação mais direta, o médico pode desrespeitar a liberdade do paciente capaz de manifestar Não consinto, doutor na iminência referida.
É compreensível que a situação identificada como risco de morte imediata potencialmente reversível seja passível de subjetividades no raciocínio médico, inclusive, elas estão sujeitas à chamada medicina defensiva que mistura necessidades/timings dos sentidos eletivo/urgência e emergência de atendimentos. A força decisória do “vai que acontece” impõe aliada ao contexto de “preferível pecar por excesso”. Só que excessos têm coirmãos chamados abusos e um deles é o desrespeito ao não consentimento pelo paciente.
O iminente risco de morte/emergência como tradicional realça ao máximo a força ética do Art. 32- É vedado ao médico deixar de usar todos os meios disponíveis de promoção de saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente. Em princípio, uma obviedade, mas sua redação contém palavras que admitem distintas interpretações numa situação de não consentimento pelo paciente: disponíveis, ao seu alcance e a favor do paciente.
No caso da recusa pelo paciente Testemunha de Jeová a uma hemotransfusão não há o desejo do paciente de morrer – como no intuito suicida -, há a crença/liberdade religiosa em jogo. A singularidade do tema motiva a acima referida possibilidade de interpretações múltiplas dos termos disponíveis, ao seu alcance e a seu favor do Art. 32, bem como de danos à saúde do paciente do Princípio fundamental VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.